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9 reflexões de André Jakurski sobre o mundo

Lendário gestor da JGP falou sobre expectativas para o governo Lula, desglobalização, China e crescimento populacional

Por Renato Santiago

23 nov 2022 11h57 - atualizado em 23 nov 2022 12h04

André Jakurski, 74 anos, é um dos maiores traders da nossa história. Ele é o “A” do Pactual (hoje BTG Pactual), banco que ele fundou com Paulo Guedes e Luiz Cezar Fernandes – o Luiz, aliás, contou alguns causos do Jakurski no episódio #20 do Market Makers.

André também é o “J” da JGP, gestora que ele fundou em 1998 junto com Guedes, quando ambos saíram do Pactual. Ele atua até hoje na asset como gestor.

Jakurski fala pouco em público e ouvir uma palestra dele é a certeza que você será apresentado por alguma ideia que ninguém tem dito. Isso aconteceu mais uma vez agora, durante sua apresentação no encerramento da JGP Credit Day, que rolou dia 22 de novembro na sede da Bloomberg, em São Paulo.

O gestor da JGP abriu falando que não perde tempo com previsões de curto prazo “porque nunca ganhou dinheiro com isso” e diz ver com muito mais clareza o que deve acontecer no longo prazo. E o que ele tem visto? Basicamente, são 3 grandes temas, que inclusive o tem deixado bem preocupado: Demografia, Desigualdade e Desglobalização.

Demografia: a população mundial vai parar de crescer ao atingir seu pico de 10 bilhões e isso vai trazer sérias consequências na dinâmica da economia e dos mercados, pois crescimento demográfico sempre foi propulsor do mundo.

Desigualdade: países desenvolvidos impediram artificialmente as últimas crises e isso trouxe sérias consequências na desigualdade da população. Hoje, governantes têm muito mais “promessas” para pagar e o único jeito de fazer isso é via taxação ou “empobrecendo” a população, via transferência de renda com juro real negativo (taxa de juros menor que a inflação).

Desglobalização: o ocidente tornou-se muito dependente da China e isso vai mudar. As consequências naturais seriam maior fricção nas negociações, mais inflação e menor produtividade, mas há um problema maior no longo prazo: a China tem ambições bélicas claras e vai impor seu modelo em Taiwan e depois vai querer impor no resto do mundo. É um problema geopolítico que pode virar um problema militar.

Resumi os 60 minutos de apresentação do Jakurski em 9 pensamentos, que você pode conferir na galeria acima.

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 1. Crescimento populacional “negativo” é extremamente dramático para a economia

Nos últimos 100 anos, a população mundial cresceu de 2 bilhões para 8 bilhões. Isso nunca mais vai se repetir: provavelmente atingiremos um pico de 10 bilhões e depois o crescimento vai parar. Isso é EXTREMAMENTE DRAMÁTICO se você pensar que o principal motor para o mundo crescer sempre foi o crescimento populacional. 

2. A ideia de que a China sempre será um motor do mundo vai sumir. 

Na China, a política de ter um só filho trouxe um problema dramático de controle da população, pois causou um desequilíbrio de ter mais homens do que mulheres (as famílias preferiam abortar uma filha mulher e tentar de novo). Pra encontrar uma esposa na China é muito difícil.

Nesse cenário a China crescer 5% ao ano será um MILAGRE, teria que ter uma explosão de produtividade na China, que acho que não vai acontecer. Ela deve crescer 3%, 3,5% ao ano.

3. Países ricos fizeram de tudo para impedir que as crises viessem. Isso terá consequências drásticas na desigualdade

As economias mais ricas não aceitaram o fato de que todo ciclo econômico termina em recessão, e adotaram medidas para impedir isso. Esses ciclos de expansão e recessão eram naturais, agora eles são muito “financeiros”. As três últimas grandes crises não vieram da economia real (recessão dos anos 90, bolha.com e subprime) e na crise da Covid, não só houve uma grande injeção financeira como também um forte incentivo fiscal. O problema de toda essa ajuda é que uma hora essa conta terá que ser paga.

4. A universalização da democracia tornou as promessas dos políticos mais caras. Para fechar essa conta, só com taxação ou via “empobrecimento da população”

Eu tenho uma tese: tudo isso que está acontecendo foi fruto da universalização da democracia. Volte 100 anos e veja quem votava na democracia da época? Só a elite financeira e religiosa. Mulheres, escravos, negros, analfabetos, minorias em geral não votavam. A ideia de democracia universal é algo muito recente. Com mais pessoas com poder de eleição, os políticos precisam fazer mais promessas para conseguir votos. Essas promessas geram despesas, que obrigam a gerar impostos.

Como resolver isso? Com o governo tomando dinheiro de quem tem. Isso já foi feito de forma “indolor” nos últimos anos, extraindo dinheiro do setor privado com juros negativos. Então a solução passa por mais taxação ou via ‘empobrecimento’ de quem tem dinheiro, ou seja: bolsa não vai subir o que subiu nos últimos 13 anos e juros reais não serão mais tão altos.

5. Se você não é um espadachim da bolsa, é melhor você ficar quietinho na renda fixa

Hoje eu claramente tenho uma preferência por investir em dívidas do que equities. Se existe oportunidade de conseguir um juro alto em alguma coisa, é bom aproveitar porque isso será cada vez mais raro. A bolsa já tem muita dificuldade de bater o CDI no Brasil. A menos que você seja um cara que consegue investir apenas nas ações que mais subiram, daí você vai ter sucesso, mas se você não é um espadachim da bolsa, é melhor ficar quietinho na renda fixa.

6. Desglobalização em processo vai gerar mais inflação e queda de produtividade

Nos últimos 20 anos, o mundo se beneficiou de produtos muito baratos, consequência da entrada da China na OMC. Consequência disso, países ocidentais transferiram suas fábricas pra China, o que tornou o mundo ocidental muito dependente deles: hoje parafuso, bateria, antibiótico, tudo é feito na China. Se ela resolve desligar a chave, ferrou pro Ocidente. A consequência da desglobalização é maior fricção do mundo, mais inflação e menor produtividade. 

7. A China pode se tornar um grande problema militar nos próximos 10 anos

A China tem ambições bélicas claras. Eu acho que nos próximos 10 anos existe um grande risco da China querer impor seu modelo de governo no resto do mundo. Ela vai fazer isso em Taiwan e depois no resto do mundo.

Em um período não muito longo, não tenho dúvidas que a China vai tomar Taiwan, e isso será um problema para os EUA por causa dos semicondutores de maior qualidade. Taiwan é um ponto nerval importantíssimo pro Ocidente. É um problema geopolítico que pode se tornar um problema militar.

8. Já foi verbalizado o plano de governo do Lula. Quem não entendeu ainda é melhor prestar atenção

No Brasil, as próximas semanas serão fundamentais por causa do jogo político em gestação que está ocorrendo. O PT quer dinheiro porque fez promessas sociais (e promessas precisam de dinheiro). Mas hoje o aparato é que o presidente não tem dinheiro, quem tem é o Congresso – e tem pouco. Então essa batalha da PEC de transição é dividida em várias: tem a batalha do PT querer aumentar o valor extra-teto ao máximo e por mais tempo possível e do outro lado tem o congresso querendo dar o menor valor possível, pra ter protagonismo nos próximos anos. 

Também é fundamental a definição de quais serão os nomes nos ministérios, pois os valores da PEC já estão sendo definidos e o plano de governo do Lula já está verbalizado. Quem não entendeu isso, é melhor prestar atenção. Os nomes são fundamentais para dar mais clareza sobre quais serão as medidas que de fato serão tomadas pelo governo.

A consequência disso tudo: taxas de juros maiores.

9. A época em que eu mais ganhei dinheiro foi quando o governo fazia muitas besteiras

É mais fácil tirar dinheiro do governo do que do mercado. Na época do Pactual, a gente fez muito gol sem goleiro, porque o governo fazia muita besteira. Tirar dinheiro do mercado é mais difícil, porque você está competindo com gente muito inteligente. Esse ano, por exemplo, está sendo bem difícil, mas nossos fundos estão indo bem.

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Por Renato Santiago

Jornalista, co-fundador do canal Market Makers e do Stock Pickers, duas vezes eleito o podcast mais admirado do Brasil. Passou por grandes redações do país, como o jornal Folha de S. Paulo e revista Exame, e atuou na cobertura de diferentes temas, de cotidiano até economia e negócios. Sua missão, hoje, é a de usar sua expertise editorial e habilidades de reportagem para traduzir o mundo das finanças e mercado financeiro ao grande público.

renato.santiago@empiricus.com.br