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A temporada de balões de ensaio apenas começou

Entre boas e más notícias do "dizem fontes" (mais más do que boas), a relação entre mercado e governo de transição tem sido tão intensa que mudou até o formato de produção do Market Makers

Thiago Salomão

Por Thiago Salomão

21 Nov 2022 10h25 - atualizado em 21 Nov 2022 10h28

Texto originalmente publicado na CompoundLetter, a newsletter do Market Makers. Inscreva-se na newsletter gratuitamente deixando o seu e-mail aqui

Balão de ensaio: jargão para caracterizar informação propositadamente vazada a fim de verificar de antemão possíveis efeitos de uma determinada medida.

Como mostramos na newsletter da semana passada (aliás, que baita repercussão que ela teve!), o “Sr. Mercado” é um ser com problemas emocionais incuráveis, muito temperamental e hiperlativo nas emoções. Ele se move de acordo com as expectativas que possui: se não há expectativas claras ou elas existem mas não são nada promissoras, a reação vai ser de forte volatilidade.

Esse ambiente de incerteza que estamos vivendo agora é extremamente propício para balões de ensaio: investidores estão sensíveis, os grupos de whatsapp estão sensíveis, nem mesmo a Copa do Mundo parece que vai acalmar os ânimos por aqui. Se o “mundo real” está sensível, não há Rivotril que acalme o Sr. Mercado.

Isso ficou claro nas últimas semanas: do “Boa Sorte Day” ao “Paciência Day”, as primeiras falas do governo de transição frustraram qualquer expectativa de um Lula moderado, deixando os investidores mais perdidos que vendedor de Budweiser no Catar.

Relembrando os fatos: após a vitória do Lula, a primeira reação do mercado foi de calmaria, por acreditar que ele viria numa postura mais conciliadora, já que ficou óbvio que “Bolsonaro perdeu, mas Lula não ganhou”, como bem definiu Luis Stuhlberger semana passada na CNN (essa afirmação foi dada pela forma como cada região votou: com cerca de 80% do PIB tendo votado pela reeleição de Jair).

Mas essa postura conciliadora foi pro saco logo nas primeiras falas públicas de Lula. Isso fez com que o até então provável ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, dizer que estava pessimista com o futuro do Brasil e desejar “boa sorte” aos investidores. Já na última semana, o petista usou o termo “paciência” ao falar sobre a queda da bolsa e a alta dólar por conta das suas sinalizações fiscalmente irresponsáveis.

Nesse intervalo, o Ibovespa veio bem pra baixo, o dólar subiu bastante e os juros futuros, que poucas semanas atrás precificavam que a Selic começaria a cair no meio do ano que vem, agora projetam novas altas na taxa básica ao longo de 2023.

Na quinta-feira, uma carta assinada por Armínio Fraga, Pedro Malan e Edmar Bacha e publicada no jornal Folha de S. Paulo, criticando as falas iniciais do governo Lula, foram uma reação imediata e importantíssima, pois os três foram talvez as pessoas mais influentes do mercado financeiro a declararem voto ao Lula. A reação foi imediata: na noite de sexta, Lula disse em Portugal que estava feliz com os conselhos que o trio deu a ele e que manteria responsabilidade fiscal.

A releitura dos episódios nesta sóbria manhã de segunda-feira esconde o calor da reação de cada uma dessas notícias ao longo da última semana – isso que não citamos as cifras e prazos propostos como “waiver” na PEC da Transição, nem o vai-e-vem de nomes ortodoxos para assumir o Ministério da Fazenda.

É assim que entram os tais balões de ensaio: aproveitando a efervescência que cada notícia traz ao mercado, o governo consegue testar a reação de cada rumor que cai na imprensa. Sinto até aflição do quanto que tenho visto o “dizem fontes” trabalhar nos últimos dias.

Um uso prático destes balões de ensaio: Meirelles parecia o nome perfeito para assumir o Ministério da Fazenda, tanto é que o mercado reagiu calmamente à vitória do Lula por esperar alguém “tipo ele”. Mas foi o nome dele sair de cena e Fernando Haddad ganhar força para ser o ministro que o mercado se desesperou. Pouco depois, nomes mais “à esquerda” foram citados, estressando ainda mais os investidores. Hoje, o nome Haddad voltou a liderar as bolsas de apostas e, embora ninguém do mercado morra de amores pelo ex-prefeito de São Paulo, este parece um nome muito melhor do que outros que foram citados pelo “dizem fontes”.

Dessa forma, o governo vai moldando qual a aceitação do mercado para cada medida, e o mercado cospe o que achou em forma de preços, expressado via juros, bolsa e câmbio. Até o momento, o saldo das respostas do mercado tem sido negativa, mas vamos aguardar os próximos capítulos: a temporada de balões de ensaio apenas começou.

Market Makers em novo formato

Diante dessa enxurrada de notícias, é bem importante separar o que é “sinal” e o que é “ruído”: sinal é aquilo que realmente precisamos levar em conta nas tomadas de decisões e que podem ser determinantes no rumo do mercado. Já ruído é tudo aquilo que acontece, no exato momento que ocorre, parece super importante, mas com o tempo ele se dissipa.

Fazer essa separação é difícil até mesmo para nós, que estamos todo dia acompanhando o mercado. Por isso mesmo que mudamos o formato das nossas lives de sexta no Instagram: o foco agora é fazer um “resumo comentado” da semana, trazendo apenas as notícias e eventos que realmente foram importantes e analisá-las junto com um especialista.

Essa seleção nos força a separar o que realmente foi importante e o que foi apenas ruído. Nos ajuda a direcionar as análises da nossa carteira e de quebra, geramos um conteúdo útil para nossa audiência. Melhor “ganha-ganha” que esse, impossível.

Na live da última sexta, nosso convidado Alexandre Silvério (CIO da Tenax Capital), disse estar preocupado com algo que não está sendo muito falado, que é a chance do novo governo anunciar incentivos parafiscais (quando faz estímulos via órgãos estatais e distorce a economia). “A certeza que eu tenho: o fiscal vai ser mais ‘gastão’, o que vai manter o juro mais alto por mais tempo”, disse Silvério.

Por outro lado, o gestor da Tenax demonstrou menor preocupação com a PEC da Transição pelo simples fato de não enxergar a menor chance do texto atual ser aprovado, pois o atual Congresso não vai dar um “cheque em branco” tão gordo e por 4 anos para o próximo governo. A ver: as notícias do fim de semana apontam que o prazo que será aprovado é de 1 ano, mas isso é assunto para o desenrolar desta semana.

Por enquanto, prepare o coração que ainda teremos muitas emoções. Pelo menos a Copa do Mundo está aí e pode servir de descompressão (isto é, a menos que você não tenha apostado no Catar na estreia da Copa, como eu fiz no bolão da firma).

Rapidinhas do dia

Yes, yes, yes! Fizemos nosso primeiro episódio em inglês na semana passada: o convidado foi Dan McCrum, jornalista do Financial Times que revelou um dos maiores escândalos da Europa: a Wirecard. A empresa de meios de pagamento conseguiu enganar tão bem o mercado que chegou a ser a maior companhia da bolsa alemã e receber um cheque bilionário do Softbank no ápice dos escândalos noticiados. Você pode assistir no youtube (em inglês, legendado em português) ou ouvir a versão em português no Spotify ou em qualquer plataforma de streaming.

Pra não dizer que não falei de Copa: o Santander soltou um relatório especial sobre a Copa do Mundo e tentou mostrar se há correlação entre mercado de ações e o vencedor da Copa do Mundo. A conclusão é que não, não há nenhuma relação entre os eventos, mas curioso ver como foi o desempenho do Brasil após as duas últimas conquistas: em 1994, o MSCI Brazil subiu 28% nos 30 dias após o tetracampeonato; já em 2002, ele caiu os mesmos 28% após o penta.

Episódio da semana em novo horário: a estreia do Brasil na quinta-feira às 16h não afetou a B3 (que vai manter as negociações rolando normalmente), mas afetou o Market Makers: como não queremos competir com a audiência da seleção brasileira, nosso episódio desta semana será transmitido quarta-feira (23) às 17h ao vivo no Youtube. O programa vai ao podcast no mesmo dia, logo após o término da live.

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Thiago Salomão
Por Thiago Salomão

Fundador do Market Makers, analista de investimentos CNPI-P, MBA em Mercados Financeiros na Fipecafi e na UBS/B3. Antes de fundar o MMakers, foi editor-chefe do InfoMoney, analista de ações na Rico Investimentos, co-fundou o podcast Stock Pickers e foi sócio da XP de 2015 a 2021

thiago.salomao@mmakers.com.br