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Da Vulcabras aos pinguins: os efeitos das tarifas do Trump
E os imprevisíveis efeitos mundo afora

Na última quarta-feira, 2 de abril, pouco depois das 17h (horário de Brasília), Donald Trump exibia orgulhosamente sua nova lista de tarifas, numa encenação que parecia um game show de horário nobre.
Mal sabia ele (ou talvez sabia) que esse gesto daria início a uma nova fase nos mercados. O “Dia da Libertação”, nome dado por Trump ao dia do “tarifaço” contra quase o mundo inteiro, provocou caos, dúvidas e perdas de trilhões de dólares em Wall Street.
“Foi a maior mudança de cenário que eu já vi em minha carreira”, disse à BloombergTV o fundador da Oaktree Capital, Howard Marks, que tem apenas 50 primaveras de mercado.
A verdade é que ninguém tinha ideia de quanto seriam essas tarifas contra importações. Havia um “palpite” de algo entre 10% (cenário otimista) e 20% (cenário pessimista). Bom, a média ficou perto de 23% – pior do que o esperado – e com requintes de crueldade a parceiros comerciais como China, Japão e União Europeia.
A reação nas bolsas foi imediata. S&P e Nasdaq tiveram suas piores semanas desde o Covid e caem mais de 20% desde o pico de dezembro. O ouro escalou para novos recordes e o dólar, que caiu na quinta-feira, disparou forte na sexta como sinal claro de “forte aversão a risco” (termo técnico para “agora f**eu de vez”).
Nada como um fim de semana no meio disso tudo para colocar a cabeça no lugar e tentar entender o que aconteceu e o que acontecerá…
Infelizmente, não é isso que você encontrará nesta newsletter. Mas trarei algumas coisas interessantes que consumi e refleti nestes dois dias.
A taxa dos pinguins
A começar, vamos falar do método para calcular as tarifas, definida como “bizarra” por David Rosenberg. Descobriu-se rapidamente que a “sofisticada” matemática de Trump não passava de uma conta simples e equivocada: dividir o déficit comercial dos EUA com cada país pelas importações totais daquele país. O resultado foi uma lista inusitada, incluindo lugares como as Ilhas Heard e McDonald – habitat exclusivo de pinguins, que receberam uma tarifa simbólica de 10% (você duvida? Olha aqui).
(Sim: uma terra habitada só por pinguins recebeu a mesma tarifa que nós, brasileiros. Às vezes é bom ter sorte, espero que nosso governo reconheça isso e não reclame).
“A incerteza por si só já é suficiente para desacelerar o consumo, a renda real e, eventualmente, a economia como um todo”, resumiu Rosenberg. Outros alvos dos EUA foram Lodo (um pequeno país africano, dependente das exportações de jeans) e Madagascar, que exporta baunilha. Como eles poderão retaliar os EUA?
Voltando à entrevista do Howard Marks: ele (que já não confia em projeções) disse que agora é ainda mais difícil prever se o mercado já caiu o suficiente ou o que virá nos próximos capítulos, pois mesmo que você acerte os próximos passos do Trump é impossível saber quais serão as reações do resto do mundo.
E se a Europa retaliar os EUA? E se a China e Europa se unirem? Qual a chance dos EUA recuarem? E se recuar, o que farão os outros? Dilemas, dilemas…
Agora, a resposta mais interessante de Marks foi sobre se os EUA ainda são um bom lugar para investir: “Sim, ainda é, mas agora ele é pior do que costumava ser. Uma das razões para investir nos EUA era o estado de direito – e isso pode ser menos verdade hoje. A mesma coisa para previsibilidade de resultados”.
Segundo Marks, o comércio global foi um dos pilares fundamentais para o período de prosperidade pós-Segunda Guerra Mundial. Uma quebra nesse paradigma geraria uma incerteza quase impossível de mensurar – isso sem contar a inflação mundo afora.
Rosenberg foi ainda mais direto, apontando a fragilidade técnica da justificativa apresentada pela Casa Branca. Para ele, a arbitrariedade das tarifas não só enfraquece a economia global, como gera uma reação em cadeia que pode empurrar os EUA para a recessão.
Mas afinal, por que Trump fez isso?
O argumento é simples: corrigir distorções econômicas e trazer empregos de volta aos EUA via industrialização (o famoso MAGA, Make America Great Again).
Mas como ignorar a importância das cadeias globais de suprimentos? Basta ver o derretimento da Nike na bolsa, por conta das pesadas tarifas sobre calçados chineses, vietnamitas e indonésios – 51,3%, 63,3% e 49,3%, respectivamente -, países que concentram fábricas das produtoras americanas. Será que a Nike conseguiria replicar o mesmo formato de produção nos EUA? Acho que os americanos não se adaptariam muito bem…
Aliás, a história acima é uma das várias evidências pra responder a pergunta “por que o Market Makers (que hoje investe apenas em ações brasileiras) está de olho nas consequências do tarifaço do Trump?”
Ora, e se o encarecimento destes tênis abrisse o mercado para o melhor e mais vendido tênis de corrida do Brasil, o “Corre”, da Olympikus? (Lembrando que somos investidores de Vulcabras, dona da marca Olympikus).
Agora, olhando o copo meio vazio: com os EUA aumentando as tarifas para Nike e companhia, esses tênis não poderiam inundar o mercado brasileiro, aumentando a concorrência por aqui?
Pedro Bartelle, CEO da Vulcabras, disse na sexta-feira que, como representante exclusivo das marcas Under Armour e Mizuno no Brasil, ligou para as matrizes para avisar que está pronto para compensar qualquer problema de desabastecimento nos EUA que possam enfrentar com o tarifaço.
A ver os próximos capítulos. Não só dos tênis, mas também dos pobres pinguins, que devem estar se perguntando o que fizeram para merecer essa atenção especial.