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De Vulcabras ao bitcoin (ou o risco do preconceito)

Conectamos num só lugar várias visões - e os episódios recentes mostram isso

Thiago Salomão

Por Thiago Salomão

10 Jan 2025 10h31 - atualizado em 10 Jan 2025 10h42

Dizem que todo empreendedor precisa ser apaixonado pelo seu próprio negócio. Dito isso, peço desculpas se eu soar exagerado nos três parágrafos abaixo, mas acredito que não exista no Brasil hoje um canal que consiga trazer discussões tão profundas sobre assuntos tão diferentes quanto o Market Makers.

Nas últimas semanas, tivemos uma aula sobre Brasil com o quarteto “Samuel, Lisboa, Mendes e Manoel”, um episódio cirúrgico e ao mesmo tempo melancólico. Mas também tivemos uma live com Bruno Garcia e Felipe Miranda para explorar por que podemos estar diante de uma grande oportunidade na bolsa. 

Também recentemente, o episódio com o Sergio Habib provou uma teoria que tínhamos aqui: é possível extrair muitos insights sobre investimentos falando com uma pessoa “de fora da bolsa”. Como me confessou um gestor de ações com algumas décadas de experiência: esse episódio foi perfeito pra quem quer fazer uma análise profunda.

Os episódios recentes só reforçam uma visão que já tem há um bom tempo: nossa empresa é um verdadeiro “Market Maker” de conhecimento. Conectamos as mentes mais brilhantes de seus respectivos segmentos com algumas pessoas obcecadas por informação de qualidade (atualmente, já são pouco mais de 3 milhões de pessoas por mês, em média).

Ser o ponto conector disto tudo não poderia ser mais gratificante. 

Em meio a essa diversidade de assuntos, na última semana trouxemos dois temas distintos mas que mostraram complementaridade nas lições extraídas: criptomoedas Vulcabras.

Vulcabras é uma empresa com mais de 70 anos de história mas que passou por uma verdadeira transformação nos últimos 12 anos, e que passou principalmente por Pedro Bartelle, na época diretor de marketing e atualmente CEO da companhia e que participou do episódio 154.

O “segredo” da Vulcabras não é tão secreto assim. Ela deixou de ser uma fabricante e tornou-se uma “gestora de marcas” (ela responde Olympikus, Mizuno e Under Armour) e investiu bastante em tecnologia e no desenvolvimento para ter um produto de qualidade. Mas não foi só isso: sua proximidade com o lojista permite que ela seja mais ágil e eficiente na entrega dos modelos e tamanhos de seus produtos

(Para entender essa lógica, pensa assim: quando um lojista vai comprar de uma marca internacional, essa compra precisa ser feita com muitos meses de antecedência e não pode ser tão customizada (quer o tênis mais bonito dos tamanhos 37 a 41? Ok, mas vai ter que levar as unidades do tênis verde limão 34 e 47). E a antecedência exagerada aumenta o risco de um tênis chegar aqui e “micar” na loja. A consequência disso: liquidação pra eliminar estoque e prejuízo).

O resultado pode ser visto no preço das ações, que subiu 19% em 2021, 40% em 2022 e 66,5% em 2023, totalizando 175% de alta no triênio 2021-2023 (no mesmo período, o Ibovespa subiu 12%). No entanto, pouca gente do mercado pegou esse rali. Na verdade, até hoje são pouquíssimos os fundos que tem posição em VULC3.

Perguntei ao Pedro Bartelle o motivo do mercado preferir outras empresas, como Alpargatas e SBF/Centauro, ao invés da Vulcabras. A resposta dele demonstra certa indignação com isso, já que tudo que o mercado sempre questionou sobre ela tem sido derrubado: 

“Disseram que a gente não tinha liquidez, daí fizemos um follow on e hoje temos 35% das ações em circulação (…). Eu sempre escutei que precisávamos entregar resultados consistentes, e nós chegamos ao 17º trimestre consecutivo de crescimento de receita. (…) Agora falam que eu não tenho acesso ao consumidor final, e isso não é verdade: hoje mais de 15% das vendas são diretas ao consumidor. (…) O que que eu vou te dizer? Das empresas que estão comparáveis, a Vulcabras já tem entregando os melhores e maiores resultados, e são anos de resultados, não é pontual. Se isso não é suficiente… Eu, como acionista, estou feliz”.

(Link do episódio completo).

Dois dias antes da publicação deste episódio com o CEO da Vulcabras, fizemos uma live sobre criptomoedas que foi realmente transformacional. E não é força de expressão: eu saí do papo com a sensação de que qualquer pessoa que assistiu a live e ainda não tinha criptomoedas em carteira, provavelmente começou a pensar em comprar – se já não comprou na hora, já que o mercado cripto não fecha.

(Apenas como endosso a essa sensação: eu, que já tinha uma leve posição em criptomoedas desde 2021 e aumentei em agosto deste ano, fiz um novo aporte, agora através de bitcoins, assim que a live terminou. Hoje, criptos respondem por cerca de 3% da minha carteira global).

O motivo veio das explicações dos convidados sobre como o risco para se investir em cripto caiu fortemente. André Portilho, head de análise da Mynt, e Alexandre Vasarhelyi, fundador e gestor do B2V, possuem mais de 30 anos de vivência no mercado financeiro e foram “convertidos” para o mundo cripto.

Dos vários fatores pontuados por eles, destaco a evolução que podemos ver na regulação, já que a eleição de Donald Trump como presidente dos EUA trará pessoas mais alinhadas ao mundo cripto e que não só darão mais acesso para este mercado, mas também acabarão com a “perseguição” que qualquer projeto ligado a blockchain ou criptoativos tinha que conviver.

Mas o bitcoin, tal qual a Vulcabras, ainda não atraiu os grandes investidores institucionais no Brasil. Para André e Alexandre, parte disso deve ser ainda causa de um preconceito existente à classe de ativos. Talvez com todos os avanços que estão por vir, estes gestores possam mudar de opinião. Ou não.

Eu entendo que o tempo é o item mais valioso na vida das pessoas e, por isso, precisamos ser muito rigorosos em como usá-lo. Criar pré-conceitos te ajuda a filtrar com qual assunto você vai querer gastar seu tempo e com qual você não vai.

Acontece que boas histórias que surgiram há um bom tempo e continuam trazendo uma boa performance seguem negligenciadas por investidores, que ainda teimam em manter os conceitos antigos ao invés de tentar entender o novo momento destas histórias.

Também na semana passada, li o que talvez tenha sido uma das melhores leituras de mercado de 2024: um relatório da Gavekal Research (referência no tema China) que foi escrito por seu fundador, Louis-Vincent Gave. O título do relatório é “Preconceito e China” e explica como os “tão bem pagos” CEOs das montadoras ocidentais não conseguiram perceber a ascensão dos carros chineses nos últimos 4 anos.

Pelo título, conclui-se que “preconceito” foi um dos motivos para isso, mas a leitura vai muito além: o efeito da pandemia, da guerra da Ucrânia e Rússia e a disseminação de informações negativas sobre a China vindas da imprensa ocidental ajudam a explicar essa ascensão chinesa.

Aliás, eu adorei este meme que Louis-Vincent diz usar sempre que vê um americano que claramente não conhece tão bem a cultura chinesa falando mal sobre a China:

(Tradução livre: você deixaria um chinês que não fala inglês, nunca visitou os EUA e não conheceu nenhum americano, explicar os EUA para você?)

Que o Market Makers continue trazendo discussões profundas de diversos assuntos e com vários pontos de vista para que, de pouco em pouco, os pré-conceitos dêem lugar para novos conceitos.

Mas enquanto houver preconceitos, haverá assimetrias entre o valor real de um negócio e o “preço de tela” que ele está sendo negociado. Vulcabras (e tantas outras empresas) que o diga. 

O poder devastador de uma mudança não imediata

Sabemos que grandes mudanças na estrutura mundial não acontecem da noite pro dia. O surgimento destas mudanças pode até ser repentino, mas a percepção do real impacto que isso trará na forma como entendemos como é o mundo demora muito mais.

Se sabemos disso, por que o mercado gasta tanto esforço em tentar adivinhar se o crescimento do lucro da empresa X no último trimestre será de 10% ou 20%? Por que tanto preciosismo se o que vai “gerar dinheiro” de fato são as mudanças transformacionais que ocorrem no mundo todo?

Peguei-me pensando nisso durante a última live que fizemos no Market Makers, no episódio 153 sobre criptomoedas. Aliás, se você não viu esse episódio, eu super recomendo para todo investidor, principalmente aquele que ainda não tem nada de cripto na carteira (ainda existe este tipo de investidor?). Aos apressados, fiz no meu twitter um resumo dos 7 motivos que devem ajudar o bitcoin a continuar subindo

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Thiago Salomão
Por Thiago Salomão

Fundador do Market Makers, analista de investimentos CNPI-P, MBA em Mercados Financeiros na Fipecafi e na UBS/B3. Antes de fundar o MMakers, foi editor-chefe do InfoMoney, analista de ações na Rico Investimentos, co-fundou o podcast Stock Pickers e foi sócio da XP de 2015 a 2021

thiago.salomao@mmakers.com.br