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É sempre sobre o fiscal

O que Zeina Latif e Fabio Kanczuk pensam sobre a situação da economia global

Por Renato Santiago

13 out 2023 10h59 - atualizado em 13 out 2023 11h19

Nos últimos meses, os títulos do governo americano, também conhecidos como treasuries, começaram a se comportar de uma maneira estranha. Primeiro as taxas dos títulos de curto prazo (dois anos) ficaram mais altas que a dos títulos de longo prazo (dez anos), o que historicamente indica que uma crise se avizinha por lá. Em seguida, essas taxas dispararam, passando dos 5% ao ano no caso das primeiras.

Isso importa, e muito, porque essas taxas são o preço mais relevante do mundo. É a chamada taxa de juros livre de risco mundial, aquela em relação à qual todos os ativos do mundo são comparados na hora que um gestor ou alocador decide por um investimento. Para valer a pena, qualquer investimento, em qualquer lugar do mundo, precisa render mais que esses treasuries. 

Como consequência disso, as bolsas pelo mundo caíram, inclusive por aqui, e o dólar subiu, batendo R$ 5,15.

O problema é que não se sabe exatamente porque isso está acontecendo. A questão fiscal americana está atrapalhando? A política por lá está no caminho da economia? Será que questões geopolíticas, como o fato de países como China e Japão, antes clientes desses títulos, não os estarem comprando com o mesmo ímpeto estão pressionando as taxas para cima?

Para tentar entender todo esse processo, sua relevância, suas causas e consequências econômicas, no episódio de ontem do Market Makers trouxemos dois economistas – ou melhor, dois doutores em economia: Fabio Kanczuk, ex-diretor do Banco Central e economista da Asa Investments, e Zeina Latif, da GIbraltar Consulting.

Entramos na conversa curiosos para ouvir as explicações deles sobre o que está acontecendo com as treasuries e com a economia americana de maneira geral, mas saímos mesmo é preocupados com o Brasil. 

Em primeiro lugar, não existe resposta fácil para o que está acontecendo na economia dos Estados Unidos e com os treasuries. Sim, os juros estão altos, mas a atividade econômica local permanece muito forte. “Os dados são compatíveis com um aumento de produtividade”, diz Kanczuk. “Mas só vamos ter certeza no futuro”, completa.

E o Brasil com isso?

Para Kanczuk, a Selic teria que cair menos do que era estimado antes dessa disparada das treasuries – mas não necessariamente o nosso BC fará isso. Por isso ele acredita que a melhor forma de “operar” esta mudança de cenário não é tentando acertar se a Selic vai até 10% ou 10,5%, mas sim comprando inflação implícita, “porque a inflação vai subir” nestas condições.

Latif, que se diz menos pessimista que Kanczuk nesse quesito, alerta para outra questão importante para a taxa de juros: uma eventual (e necessária) mudança de discurso do ministro da Fazenda, Fernanda Haddad, sobre a situação fiscal do Brasil. Esse será o grande teste de Haddad, na visão da Zeina: caso ele passe no teste, a Selic terá espaço aberto para cair mais.

“O que define no final é a qualidade da nossa política econômica aqui. Se a gente tivesse maior tranqulidade em relação à gestão fiscal, todas essas restrições de que vêm de fora seriam mais palatáveis, mais fáceis de digerir”, diz Latif. “Temos uma gestão fiscal de baixa qualidade (…) num quadro de pressão das treasuries, aumenta muito a volatilidade da moeda e da economia”, completa.No fim, é sempre sobre o fiscal.

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Por Renato Santiago

Jornalista, co-fundador do canal Market Makers e do Stock Pickers, duas vezes eleito o podcast mais admirado do Brasil. Passou por grandes redações do país, como o jornal Folha de S. Paulo e revista Exame, e atuou na cobertura de diferentes temas, de cotidiano até economia e negócios. Sua missão, hoje, é a de usar sua expertise editorial e habilidades de reportagem para traduzir o mundo das finanças e mercado financeiro ao grande público.

renato.santiago@empiricus.com.br