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Existe chance de um “Flávio Trade” em 2026?

O "balão de ensaio" que começou a ganhar contorno de candidatura real

Thiago Salomão

Por Thiago Salomão

15 Dec 2025 11h14 - atualizado em 15 Dec 2025 11h14

Nós, do mercado financeiro, adoramos criar nomes bonitinhos para aquilo que, no fundo, é só incerteza empacotada em narrativa. 

Foi assim na segunda metade de 2024 com o “Tarcisio Trade”. Era simples de entender: com a desaprovação crescente do governo Lula e Jair Bolsonaro na iminência de ficar impedido de participar da eleição, Tarcísio de Freitas surgia como o personagem aglutinador da centro-direita, tendo reais chances de ganhar o páreo de 2026.

Isso seria música para os ouvidos faria-limísticos: um presidente com excelente currículo técnico, que conversa bem com o setor privado, se preocupa com fiscal e que já entregou bons resultados como ministro e como governador do maior estado do país… 

Impossível não ficar otimista com ativos brasileiros – ainda mais nos patamares atuais de preço e de subalocação.

Só que política brasileira não é planilha de Excel. E se fosse, certamente seria aquela planilha cheia de macro quebrada que você herdou de outra pessoa.

Foi mais ou menos isso que aconteceu quando o nome de Flávio Bolsonaro entrou de vez no tabuleiro.

E o que parecia só um “balão de ensaio” começou a ganhar contorno de candidatura real. Flávio já está frequentando eventos do mercado financeiro, aparecendo em podcasts e se posicionando como o herdeiro dos votos do pai.

Com isso, o jogo mudou no mercado: se antes a discussão era “quando o Tarcísio vai assumir o papel de candidato à presidência?”, agora as dúvidas são “Se o candidato anti-Lula em 2026 for de fato o Flávio Bolsonaro, ele tem chances de ganhar? E havendo vitória, será bom para os mercados?”

Se o mercado vai gostar ou não, tivemos um teste disso na sexta-feira retrasada: quando saiu a notícia da candidatura de Flávio Bolsonaro, a bolsa brasileira despencou bruscamente e o dólar subiu.

Isso significa que o mercado não gosta do Flávio? Não vejo dessa forma. Acredito que a reação do mercado foi mais por uma análise relativa: não é por não gostar do filho do Bolsonaro, mas sim por gostar muito mais do Tarcísio. Afinal, o governador de São Paulo aparenta estar bem preparado e bem assessorado para um governo. o que o torna mais competitivo para enfrentar Lula.

Enquanto isso, Flávio tem mais rejeição do que Tarcísio em boa parte dos segmentos urbanos. Embora ele possa abraçar muito mais votos do “bolsonarismo raiz”, parte do eleitorado de centro, que topava embarcar no “Tarcisio Trade”, pode torcer o nariz para a volta de um Bolsonaro.

Traduzindo para o dialeto do mercado: a chegada de Flávio diminui a chance de uma candidatura Tarcísio deslanchar – e, por tabela, deixa o Lula mais competitivo. Isso significa mais volatilidade nos próximos dias/semanas/meses.

É aqui que nasce a pergunta que dá título a essa newsletter: como fazer para Flávio Bolsonaro de fato tornar-se um “Flávio Trade”? 

Essa pergunta se divide em duas: i) Flávio consegue tornar-se competitivo o bastante para vencer Lula? ii) E, caso vença, isso será necessariamente uma “boa notícia” para os mercados?

Conversei com muita gente nos últimos dias para tentar montar esse quebra-cabeça. Senti que minhas conclusões não fugiram do óbvio, mas ainda assim vale a pena organizar todas as ideias num único plano:

> Tarcísio já se provou de várias formas ser um excelente nome para concorrer em 2026. Mas para vencer ele precisa do apoio do bolsonarismo.

> A candidatura do Flávio Bolsonaro, obviamente, torna esse apoio inviável – ou no mínimo, esvazia esse apoio. Valeria a pena para ele largar uma reeleição em São Paulo para disputar uma presidência dividida entre os próprios aliados?

> Tarcísio já encontrou uma solução, a princípio: ele tem mostrado que todos estão juntos contra um único inimigo, que é o Lula. Foi o que ele sinalizou na sua fala em evento na última quinta-feira.

> Minha interpretação sobre este discurso é que sua candidatura não está descartada para 2026, apesar da chance ser menor.

> A única forma de Flávio ser uma alternativa viável é acenar para o centro, tal qual seu próprio pai fez em 2018 com várias lideranças empresariais e o Lula fez em 2022, colocando nomes como Geraldo Alckmin e Simone Tebet em sua equipe.

> Em meio a todos esses exercícios probabilísticos, vale lembrar o que Paulo Hartung vem dizendo recentemente, tanto em nosso podcast quanto em aparições públicas: Mercado é muito ansioso, mas a política não anda na mesma velocidade que o mercado. Até março-abril não devemos ter nenhuma novidade concreta na política. Até lá, teremos muitos ruídos e poucos sinais.

> Não podemos esquecer, no entanto, os vieses que carregamos em nossas opiniões. Um gestor multimercado com quem eu conversei no fim de semana trouxe uma fala bem interessante sobre o “wishful thinking” que a Faria Lima costuma criar:

“Mercado quer sempre ser feliz: se precisa acreditar que candidatura de Flávio é blefe, acredita…. Agora, se a candidatura vira realidade, aí acredita que ela virá com Paulo Guedes e companhia e por isso será bom.

Só acho que o mercado ignora a outra cauda, como falaram Stuhlberger e Parreiras, da Verde Asset, no Second Level. Dominância fiscal e trajetória Dívida/PIB podem ser um movimento de descontinuidade.

Não é por que não deu m*rda até agora que podemos continuar na mesma trajetória. O gênio tinha saído da lâmpada em 2015 e papai do céu nos mandou impeachment com Temer e seu dream team, além do PG no primeiro ano do Bolsonaro.

Acho sim que a eleição tem todos os ingredientes para ser vencida pela oposição, a exemplo do que vimos na América Latina e nas mudanças identificadas no eleitorado. Mas a dificuldade da família Bolsonaro em largar o osso pode causar uma confusão na oposição, abrindo espaço para que Lula, mesmo velho e com alta rejeição mas tendo ao seu lado o uso da máquina pública, ganhe novamente.”

Enquanto escrevia este texto, lancei a seguinte enquete no grupo dos assinantes do M3 Club (a comunidade de investidores do Market Makers): Você acredita em um “Flávio Trade” caso Flávio Bolsonaro vença as eleições em 2026?

A resposta:

Será que o filho do Bolsonaro fará esse aceno ao mercado? Bom, vamos ter a chance de perguntar isso diretamente pra ele: na quarta-feira o Market Makers receberá Flávio Bolsonaro para gravação de um podcast. O resultado vocês conferem na quinta-feira às 18h.

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Thiago Salomão
Por Thiago Salomão

Fundador do Market Makers, analista de investimentos CNPI-P, MBA em Mercados Financeiros na Fipecafi e na UBS/B3. Antes de fundar o MMakers, foi editor-chefe do InfoMoney, analista de ações na Rico Investimentos, co-fundou o podcast Stock Pickers e foi sócio da XP de 2015 a 2021

thiago.salomao@mmakers.com.br