Se você acompanha o Market Makers, já se acostumou com a pergunta que inclui no ping pong de encerramento, que é:
“Qual a maior gentileza que já te fizeram na vida?”
Talvez você não saiba que essa pergunta foi uma inspiração de outro podcaster, que por sua vez também se inspirou em outro podcaster (os fãs do filme “Clube da Luta” certamente lembraram do “tudo é uma cópia de uma cópia”…).
9 meses atrás, eu e meu sócio Josué fomos entrevistados pelo Lucas Abreu. Foi ele quem me apresentou essa pergunta, pois ela foi feita para nós dois.
E o Lucas revelou que a pergunta é feita por Patrick O’Shaughnessy, apresentador do “Invest Like The Best”.
Eu, que não tenho pudor nenhum em copiar boas ideias, inclui ela no meu roteiro. E o resultado no Market Makers foi maravilhoso: já ouvi de tudo dos nossos convidados, com alguns relatos que talvez eles nunca tivessem oportunidade de dizer em outro lugar.
Teve o episódio com o Gustavo Cerbasi em que ele contou toda trajetória de uma doença familiar, que resultou em um transplante de rim que ele teve que receber — e quem doou foi a esposa dele, Adriana. Teve o professor Clóvis de Barros Filho contando do dia que um japonês o “humilhou com gentileza” num voo. Teve o Luiz Masagão (diretor da B3) contando quando o Sergio Rial lhe deu um super voto de confiança após um erro cometido na tesouraria do Santander.
O mais belo dessa pergunta é que ela diz menos sobre o convidado e mais sobre o que ele aprendeu a valorizar.
O tema “gentileza” ficou latente na minha mente na última semana por causa do convidado do episódio #287: Florian Bartunek. 9 anos atrás, um simples gesto dele fez toda diferença no meu futuro.
A gentileza do Florian
2016. A primeira edição do livro “Fora da Curva” tinha acabado de sair. 10 histórias de brasileiros que conseguiram resultados extraordinários com uma mistura de método, teimosia e sorte.
Eu, na época chefe da editoria de Mercados do Infomoney e já apaixonado pelo assunto, tive uma ideia após devorar o livro: entrevistar os 10 personagens do livro, repercutindo a história já contada e abordando curiosidades deixadas nas páginas.
Pedi isso ao Florian (que, vale dizer, pouco me conhecia). Eu esperava um “deixa eu ver” protocolar, mas o que eu ganhei foi um “ótima ideia! Claro que sim”.
Com um email de apresentação explicando quem eu era e por que valia a pena conversar comigo, Florian me conectou com cada um dos outros 9 personagens do livro.
Em outras palavras: ele emprestou a reputação dele pra mim. E isso não tem dinheiro que pague.
A cada “aceite”, eu era um misto de felicidade com “f*deu, e agora?”. Afinal, minha experiência com entrevistas era minúscula se for comparar com o tamanho de cada um dos personagens do livro.
Felizmente, deu tudo certo. E ter conseguido fazer bem este trabalho me mostrou o que eu realmente queria fazer dentro do mercado financeiro: contar a história destas lendas do mercado e aprender na prática a como se tornar um melhor investidor.
Essa gentileza do Florian mudou a minha vida. Mas ela só não foi a maior que já fizeram por mim na vida porque, ao longo do processo de gravações, uma outra gentileza se tornou a maior de todas.
A ligação que mudou tudo
Entre os personagens do Fora da Curva que eu entrevistei graças ao Florian, estava um tal de Pedro Damasceno, um dos sócios da Dynamo – a maior referência do Brasil quando o assunto é gestora de ações,
A entrevista, realizada na sede da gestora, no Rio de Janeiro, foi muito especial. Eu estava nervoso, claro, mas saí com a sensação de que tinha feito um bom trabalho.
De volta a São Paulo, publiquei a entrevista e fui tocar a vida (trabalhar num portal de notícias hard news sobre mercados não te permite celebrar matérias feitas).
Até que o telefone tocou.
Do outro lado da linha, o próprio Pedro Damasceno.
“Fudeu, fiz alguma merda e ele ligou pedindo correção”, pensei eu naqueles centésimos de segundos após ouvir o nome dele.
Pelo contrário. Ele ligou para agradecer o resultado, dizer que recebeu muitos elogios e soltou algo como “continue assim, você tem futuro”.
Isso mudou minha vida.
Ele não precisava ter ligado. Podia ter mandado um e-mail padrão “obrigado pela entrevista”. Aliás, ele poderia não ter feito nada — o normal seria isso. Mas ele ligou.
Um minuto da vida dele… que fez toda diferença na minha vida daquele momento em diante.
Eu desliguei o telefone com uma certeza silenciosa: se gente desse calibre achava que eu tinha futuro nisso, talvez valesse a pena apostar mais pesado nessa história de ouvir pessoas inteligentes e transformar essas conversas em conteúdo.
De lá até o Market Makers tem muita estrada, muita mudança, muita encruzilhada. Mas a semente estava ali.
Não foi a maior gentileza da minha vida no sentido grandioso de doar um órgão, salvar alguém de um acidente ou algo do tipo.
Mas foi, disparado, a gentileza que mudou o rumo da minha carreira.
E ela só aconteceu porque, um pouco antes, o Florian tinha sido gentil o suficiente pra abrir aquelas portas.
Pedro infelizmente faleceu no ano seguinte, muito jovem, vítima de um infarto fulminante. Seus ensinamentos sobre investimentos estão eternizados no Fora da Curva 1. Espero que este relato ajude a transmitir também a aula de gentileza.
O resumo disso tudo
A cada vez que eu pergunto no final do Market Makers “qual a maior gentileza que já te fizeram na vida?”, automaticamente esta cena da ligação passa na minha mente. E me lembra da importância de retribuir isso e passar adiante.
Se um dos 3 leitores desta newsletter pensou no “Florian” ou no “Damasceno” de suas vidas pessoais, faz o seguinte: manda uma mensagem pra essa pessoa.
Não precisa ser longa. Pode ser um simples:
“Lembrei hoje de uma gentileza que você fez por mim. Obrigado.”
O mercado é feito de ciclos. A vida também. O que vai, volta — inclusive a forma como a gente trata os outros.