Notícia

4min leitura

icon-book

Sobre Hapvida e o risco do investimento consensual

Lições do mercado que devemos sempre lembrar

Thiago Salomão

Por Thiago Salomão

01 Dec 2025 12h17 - atualizado em 01 Dec 2025 12h20

A história da Hapvida nos traz (ou nos relembra) de importantes lições do mercado que jamais devem ser esquecidas.

De forma objetiva, a Hapvida apresentou um resultado operacional 30% abaixo das expectativas. Essa frustração é fruto de uma combinação de um pior desempenho em diferentes linhas de custos e despesas, que resultaram numa queda de margens – a margem EBITDA foi de 6,2%, bem abaixo dos 8,5% esperados.

5 pontos fundamentais frustraram os investidores:

  1. Crescimento de vidas abaixo do esperado, impactado sobretudo pelo churn em PME e pela menor adesão em São Paulo;
  2. Sinistralidade acima do previsto para a sazonalidade, reflexo de um inverno mais frio e maior utilização das redes;
  3. Aumento das despesas comerciais, em um ambiente mais competitivo;
  4. Avanço das contingências e multas da ANS; e
  5. Queima de caixa em torno de R$ 200 milhões, consequência do resultado mais pressionado e do pagamento de acordos passados.

Tudo isso contribuiu para a queda de 40% das ações no dia pós-resultado. 

O que já foi a queridinha dos gestores de fundos, sobretudo após a fusão entre Hapvida e Intermédica anunciada anos atrás, tornou-se a principal detratora destes mesmos gestores em novembro. 

No entanto, uma ação cair 40% em um único dia pode significar muita coisa além do pensamento óbvio de que “ela está hoje 40% pior do que estava ontem”.

No caso da Hapvida: grandes fundos tinham o papel em carteira, por acreditarem que o pior já havia passado e, apesar dos riscos, o potencial de ganho era muito maior.

A frustração com os resultados entregues e a má comunicação da empresa, por mais um trimestre, fez com que muitos investidores apertassem o ZEM (“Zera Essa Merda”). Fool me once, shame on you. Fool me twice, shame on me.

Em um mercado de liquidez reduzida como está o Brasil, o impacto não poderia ser outro: queda muito forte.

Mas cuidado: queda “aparentemente exagerada” não necessariamente é queda exagerada. Ouvi na quinta passada a fala do Marcos Peixoto, head de renda variável da XP Asset, explicando que “vendeu Hapvida na abertura do pregão pós-resultado pois eles revisaram suas projeções de lucro da empresa em 50% para baixo e a ação abriu caindo só 30%”.

De novo: da mesma forma que o analista precisa ter senso crítico para procurar os riscos onde todo mundo só vê upside, ele precisa fazer as contas para concluir se uma queda de 40% num único dia é oportunidade ou não.

Outra lição muito importante: cuidado com investimentos “consensuais”. Aqui no Market Makers, evitamos ter empresas que muita gente gosta no nosso fundo. Isso inclusive gera uma supresa aos que perguntam se usamos nosso podcast para pegar ideias para montar nossa carteira. Nossa resposta costuma ser: “claro que sim! Quando vários gestores falam bem de uma mesma ação, nós rapidamente desistimos de investir nela”.

Não fazemos isso apenas pra ser “do contra”. Primeiro porque se tem muitos investidores com uma mesma empresa na carteira, haverá menos compradores potenciais na praça – em outras palavras, há menos espaço pra ação subir. Da mesma forma, uma surpresa negativa pode fazer a ação cair muito mais forte do que deveria.

Segundo motivo é a maior dificuldade para termos um diferencial de opinião. Veja a Hapvida como exemplo: os melhores analistas das principais gestoras de ações, bancos, corretoras e casas de análise já estão acompanhando o papel, alguns com bastante proximidade com o management inclusive. Como conseguir gerar uma opinião diferente do que esse consenso?

Colocando esse fator dentro de um mercado de liquidez reduzida como o Brasil, temos o que Paulo Abreu, gestor da Mantaro Capital, sintetizou durante evento que a gestora promoveu semana passada: “consenso virou fator de risco”.

Isso não significa que jamais iremos investir em ações como Itaú, Equatorial, Localiza, BTG, Natura etc… apenas significa que, para investirmos nelas, a relação “risco-retorno” tem que ser gritantemente melhor do que de outras empresas de nosso universo de cobertura.

O fundo MARKET MAKERS FIA completou 39 meses de vida e acumula ganhos de 52,4% no período (já líquidos de taxas), contra alta de 43,9% do Ibovespa.

Para finalizar, um parabéns público à equipe de análise de fundos da Empiricus Research, que entrou em contato com vários gestores de fundos de ações para saber o que eles fizeram com Hapvida após o resultado.

Ao todo, 21 gestores disseram ter HAPV3 em carteira, com posições que variavam entre 1% e 8,4% da carteira. 5 destes gestores disseram ter zerado ou reduzido a posição pós-divulgação do balanço, enquanto 2 aumentaram posição após a queda (o nome das gestoras respondentes não foi revelado). Um super trabalho de apuração que ajuda a mostrar para nós, investidores, como os profissionais lidaram na prática com este evento tão impactante.

Compartilhe

Thiago Salomão
Por Thiago Salomão

Fundador do Market Makers, analista de investimentos CNPI-P, MBA em Mercados Financeiros na Fipecafi e na UBS/B3. Antes de fundar o MMakers, foi editor-chefe do InfoMoney, analista de ações na Rico Investimentos, co-fundou o podcast Stock Pickers e foi sócio da XP de 2015 a 2021

thiago.salomao@mmakers.com.br