Notícia
6min leitura
Carta aberta a Milton Maluhy, CEO do Itaú
Uma aula sobre liderança e cultura empresarial
Caro Milton Maluhy Filho, CEO do Itaú Unibanco:
Quem escreve é Thiago Salomão, fundador da Market Makers, apresentador do Market Makers Podcast e que todas as segundas despeja textos livres nesta newsletter.
Na semana passada, estive no evento de aniversário de 15 anos da SPX. Minha grande expectativa estava pro painel de encerramento, que iria juntar os sócios Rogério Xavier, Marcelo Castro e Bruno Pandolfi. E as expectativas foram cumpridas: basta ver a repercussão de um pequeno trecho do painel que postei em meu twitter:

Aliás, fiz um resumo mais completo deste encontro mas enviei apenas aos assinantes do M3 Club. Então se você ainda não faz parte do nosso seleto grupo, deixo o convite para você conhecer – clique aqui para fazer sua adesão.
Mas não vim fazer autopropaganda, na verdade queria te dizer que fui positivamente surpreendido pelo painel antes do encerramento, no qual você participou de uma agradável conversa com Leonardo Linhares, sócio da SPX e head de ações da gestora.
Sua fala foi uma das melhores aulas que já vi sobre liderança. Se tivesse que dar um nome para o que assisti, seria Liderança em Tempos de Conforto. Não, não acho que ser CEO do maior banco da América Latina seja tranquilo. Mas foi incrível você contar com detalhes como transformou a cultura de uma empresa quase centenária, líder do setor e que vem entregando recordes atrás de recordes em seus resultados.
No futebol, costumamos dizer que em time que está ganhando não se mexe. Pra que mudar o que está funcionando?
Aliás, essa máxima é tão verdadeira que o próprio Leo Linhares revelou que “quando soube que o Milton seria CEO do Itaú, minha primeira reação foi: vende!”
Compilei os melhores aprendizados desta conversa e te entrego neste texto como forma de agradecimento pelo conhecimento compartilhado. E ao final do texto, tenho um convite especial para você:
Liderança em Tempos de Conforto – inspirado no painel de Milton Maluhy Filho (CEO do Itaú)
Milton, que tem ao todo mais de 25 anos de Itaú, estava no BBA (adquirida do Itaú e focada no atacado) quando recebeu um convite do Roberto Setúbal para ir trabalhar no banco de varejo.
“Fiquei na dúvida do convite porque pensava que o glamour estava no atacado. Mas o Roberto me disse o seguinte: ‘se você quer ser presidente do banco, você precisa ir pro varejo’. O argumento era forte, então fui pra lá”, explicou Milton.
Daí foram várias experiências: foi para o Chile tocar a fusão com a Corpbanca (“essa história valia um livro, passei 3 anos intensos, foi um PhD on the job, ali aprendi a ser CEO de fato, nada se compara com essa experiência no Chile”), voltou para o Brasil como CFO e CRO até que em outubro de 2020 veio o convite para assumir como CEO.
Milton conta que o banco tinha dois grandes desafios: a transformação digital e a transformação cultural. “Mudar aquilo que está dando certo nunca é fácil, mas eu achava que precisávamos mudar isso. Fizemos uma pesquisa com funcionários, 60 mil responderam e 90% disseram ‘o banco precisa mudar a cultura, não sei como’”.
Nessa hora, Milton percebeu que, se ele queria ver a cultura do banco mudar, ele precisava mudar sua própria cultura. E assim o fez, através de atos que visavam descentralizar o poder e dar agilidade nas tomadas de decisão. “Não é menos controle, é mais controle, mas com poder descentralizado para ganhar agilidade”.
Uma das mudanças foi o aumento do comitê executivo: “eram só 6 pessoas que tomavam decisões de uma empresa com R$ 3 trilhões de ativos, que atua em 18 países e tem dezenas de milhões de clientes”. Quanto mais centralizado fosse o Itaú, mais devagar seria sua evolução.
A partir daí, Milton contou que o Itaú mudou o modelo de partnership, simplificou a nomenclatura dos cargos (“sempre tivemos uma estrutura muito pesada, com vários cargos em cima de cargos”), medidas estas que foram tornando a cultura do banco mais leve.
Milton exaltou bastante a arte de delegar e suas consequências: “delegar te torna mais humilde: o maior problema de um líder muito grande é que ele pode ficar cego, preso em suas convicções”.
Mas delegar não é apenas dar liberdade: é preciso ter tolerância a erros. “Antes, tínhamos muito erro de errar. Isso desestimula a coragem. As pessoas precisam confiar no time, nos pares e ter liberdade para errar”, diz Milton.
Nessa fala sobre confiança, uma frase que ele disse que me marcou foi: não tenha medo de dar passagem pra quem é melhor que você, se não você vai perdê-la. Certamente uma das lições mais difíceis de se colocar em prática, seja por ego ou por medo de sentir-se inútil.
E nessa linha, ele também disse: não existe carteirada. Um exemplo prático dado por ele: “O ex-presidente FHC dizia que no final de um dia difícil ele só precisava de um bom whisky e um bom puxa saco. Nós não temos essa visão. Se um analista júnior levantar a mão numa reunião e dizer que determinada ideia vai nos levar pro caminho errado, eu vou querer ouvir o motivo”.
Daí, outra pedrada do Milton: lealdade não pode ser critério de avaliação. Você tem que estar confortável para que as pessoas se contraponham. Uma pessoa muito leal não necessariamente dirá uma verdade difícil de ouvir.
Apesar das várias mudanças no Itaú, Milton fez questão de exaltar um valor atemporal: ética. “Não existe jeito certo de fazer coisa errada. Não temos problema por sair na imprensa porque o ex-CFO está saindo com processo ou por problemas na demissão do CMO. A gente faz o que é certo e não importa o resto”.
Ele ainda disse que 80% das decisões que ele toma pioram o bônus dele no ano, mas maximizam o valor do banco no longo prazo. Founder’s Mindset, diria Cristiano Souza (se não entendeu a referência, é porque você não viu um dos episódios mais emblemáticos da história do Market Makers. Clique aqui para corrigir este erro).
Quando Leo Linhares pediu ao Milton passar uma mensagem para o mundo sobre liderança, ele respondeu: “Coragem e escuta ativa. A única certeza que eu tenho é que eu não tenho todas as respostas. Se você não for obcecado pelo seu cliente, a transformação não vai acontecer. Você precisa formar líderes na organização e acreditar no conjunto”.
Algumas outras frases importantes e impactantes que Milton disse sobre liderança:
> Você precisa falar sempre sobre a cultura, precisa evangelizar, fazer as pessoas acreditarem.
> Você é o exemplo da sua empresa. Não transgrida os valores dela.
> Seja paranoico com a concorrência e humildade pra ver sempre o que eles estão fazendo.
No final, Leo pediu um conselho para a SPX, mas claro que se vale para a maior gestora do Brasil, pode ser útil para todos nós:
“Continuar o caminho e perpetuar o partnership. Quem está dentro precisa sentir que quer ficar por mais uns 15 anos. E saber também ‘dar saída’ para os antigos que querem sair. Saber reconhecer cedo quem pode ser líder e dar espaço, saber a hora de passar bastão e reconhecer que tem outros melhores do que você para tocar o negócio”.
Convite: em determinado momento do painel, Milton disse que pode falar por duas horas sobre mudança de cultura. Ora, está feito: venha ao Market Makers e você poderá falar por duas horas (ou mais!) sobre isso. Tenho certeza que nossa audiência vai adorar te ouvir, assim como eu adorei.
Aguardo retorno, Milton.
Forte abraço,
Thiago Salomão