O bode na sala (ou por que parece que o mercado nunca melhora)

Desde 2019, minhas manhãs de quinta são acompanhadas da Leila, minha psicóloga. Desde 2019, eu aprendo coisas novas sobre mim, sobre as pessoas e sobre o mundo (um beijo e um obrigado, Leila).

Eu não anoto nada na terapia, deixo que os aprendizados sejam absorvidos naturalmente no meu subconsciente. Por isso, fico muito feliz quando uma lição aprendida na terapia me vem à mente.

Eu estava com um problema muito grande e persistente na minha vida. Quando finalmente consegui resolvê-lo, o alívio que me deu foi ótimo, mas durou pouco: outro problema, não tão grande quanto o anterior mas bem mais antigo, começou a pulsar na minha cabeça.

Leila explica: “Thiago, o nosso cérebro funciona assim: imagine duas prateleiras com 5 caixinhas em cada. Cada caixinha é um problema a ser resolvido. Para entrar um novo problema nesta prateleira, você precisa resolver um dos problemas. É por isso que esse problema antigo só surgiu agora”.

É como a analogia do bode na sala, que todos os três leitores desta newsletter devem conhecer. De forma resumida: se você acha que está com problemas insolúveis na sua vida, coloque um bode na sua sala; depois que ele destruir todos os seus móveis, cagar por todo canto e causar um super estrago, tire o bode e verá como parece que a vida melhorou muito.

Toda essa reflexão me veio após uma coisa que foi dita pelo Albano Franco, gestor de crédito da SPX, no episódio 148 do Market Makers, publicado na última quinta-feira (7). É uma reflexão triste, já adianto, e torço para que ela não esteja certa.

Provoquei o Albano, que começou no mercado como analista de ações mas há 15 anos dedica-se à análise de crédito (sendo os útimos 5 anos na SPX), sobre por que a bolsa brasileira não sobe mesmo com todos os indícios de que ela está barata.

A resposta dele baseou-se num artigo escrito em 2015 por André Lara Rezende, chamado “Corrupção e Capital Cívico”. Na época, o Brasil estava passando por uma verdadeira limpeza com a Operação Lava Jato. Isso era ótimo, mas havia um risco: se a corrupção fosse exposta mas não conseguisse “limpar tudo”, isso  causaria um efeito colateral de impunidade e descrença na relação das pessoas.

“Aconteceu exatamente o que André Lara temia: o efeito da propaganda da corrupção. Fizeram uma grande propaganda anti-corrupção, não extirpou o mal por completo e agora temos uma sensação de impunidade (…) Muitas empresas listadas na Bolsa estão numa situação melhor, mas o capital cívico do Brasil se perdeu. Quanto tempo demora para recuperá-lo? Para perder é rápido, mas para construir é tijolo por tijolo”, disse Albano no episódio 148 do MMakers.

Será que o tamanho do corte de gastos é realmente a solução? Ou estamos apenas tirando o bode da sala e achando que “agora vai”, mas na verdade temos um problema maior a enfrentar?

Sim, é óbvio que o corte de gastos é o bode na sala. Não sou tão ingênuo assim, risos. Mas parece que o outro problema é bem maior do que parece. 

Em meio a tudo isso, fico muito orgulhoso em conseguir extrair novos aprendizados com o Market Makers, mesmo após 150 episódios. É o compounding do conhecimento na sua mais pura essência.

No entanto, torço para que esta reflexão se prove errada. Ou, se certa estiver, que a gente corrija essa rota logo.

Dica de leitura: como não falei nada sobre o resultado da eleição dos EUA (talvez o maior “bode da sala” que o mundo tinha no momento), deixo o texto que Daniel Leichsenring, ex-economista chefe da Verde Asset, publicou no Brazil Journal. O link está aqui.

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