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O que pode estragar a festa da bolsa
O que tira o sono dos gestores que investem em ações no Brasil?
Parece ser consenso no mercado financeiro que a bolsa brasileira está cheia de oportunidades e que a economia está dando bons sinais para o futuro.
É o que nos têm dito recentemente os gestores que entrevistamos, o Ibovespa, que subiu 20% desde seu pior momento no ano, e também a expectativa para os juros futuros, hoje prevendo a Selic na casa dos 9% quando o ciclo de cortes terminar (não existe opinião mais sincera que o preço).
Sempre que eu percebo um consenso sobre o futuro, já começo a pensar: onde isso pode dar errado? É minha natureza e meu papel aqui no Market Makers. No caso da bolsa e da economia brasileira, encontramos a resposta no nosso episódio da última quinta-feira, com Gabriel Raoni e Bruno Barreto, dois gestores da IP.
Os números de alocação da IP mostram que eles também acreditam que há boas empresas negociadas a bons preços no Brasil. Hoje a carteira tem cerca de 50% de alocação local, algo que não acontecia desde 2017. Mas, segundo o que eles nos falaram no episódio, esse número poderia ser maior não fossem duas questões que ninguém além deles parece estar prestando muita atenção.
O primeiro e maior desses problemas que podem frustrar o otimismo com a Bolsa é o endividamento das famílias brasileiras. Nos últimos 5 anos o brasileiro se endividou muito, e com dívidas de cartão de crédito, cujos juros chegam perto dos 450% ao ano. Nesse período, o número de cartões saiu de 100 milhões para mais de 200 milhões no país. “Esse mercado cresceu três vezes mais que o PIB nominal do país (…) As pessoas estão usando cartão de crédito como capital de giro”, diz Raoni.
O resultado deste movimento são números bem feios:
- 80% das famílias brasileiras têm dívidas;
- 30% das famílias estão inadimplentes;
- 33% é a proporção das dívidas das famílias em relação ao PIB;
- 70 milhões de pessoas, aproximadamente, estão negativadas no país. Isso é cerca de metade da nossa população adulta.
Endividamento e crédito são bastante importantes para o crescimento do país, uma vez que é usando essas ferramentas que as famílias consomem e fazem o PIB crescer. Com uma alavancagem já muito alta da população, é justo supor que o crescimento do PIB no futuro pode estar comprometido. “Temos muitas dúvidas sobre como isso vai se desenrolar”, afirma Raoni. Por isso, a IP fica longe de empresas muito expostas às classes mais baixas e médias e preferem companhias dominantes em seus mercados e que estão nos mercados A e B, como a Vivara.
Reforma tributária
Outro fator que deixa a IP mais cética quanto ao cenário brasileiro é a reforma tributária. Em primeiro lugar, a reforma que passou já traz uma série de incertezas que podem afetar a rentabilidade das empresas, uma vez que as alíquotas ainda não foram estabelecidas, há incerteza sobre a tributação de dividendos e dúvidas sobre a continuidade do JCP, os juros sobre capital próprio, usados pelas empresas como artifício contábil para diminuir o pagamento de impostos.
Além disso, com o novo arcabouço o governo também se impôs uma meta de zerar o déficit fiscal em 2024. Para tanto, é preciso encontrar pelo menos R$ 110 bilhões.
Com essa agenda de arrecadação, pode sobrar para as empresas, em uma eventual reforma tributária da renda. Quanto a esse problema, a solução da IP é permanecer em empresas que tenham maior poder de repasse.