Existe uma percepção no mercado de que, para ser um bom investidor, é preciso estar super conectado a tudo que acontece no mundo a todo momento e sempre muito bem informado.
Se isso existe de fato, eu discordo totalmente.
Meu texto hoje é quase um desabafo pra dizer por que eu acredito que, quanto mais informações um investidor tem acesso, maiores as chances de ele cometer erros.
É uma opinião totalmente pessoal, fundamentada nos meus 15 anos acompanhando o mercado bem de perto. Durante esse tempo, o acesso à informação ficou muito mais democrático. Por um lado, isso é ótimo; porém, a falta de um filtro dificulta separar o que é importante e o que é um ruído – inclusive para os profissionais.
Há também o fator “perda de tempo”: quanto mais tempo perdemos com pequenas notícias, menos tempo teremos para estudar de fato o que importa para ganhar dinheiro (balanço das empresas, relatórios de análise etc). Todos os seres humanos têm 24 horas por dia. Cabe a você fazer uma boa gestão desse seu portfólio temporal.
Meu primeiro contato com o mercado foi em 2008, mas considero minha entrada em 2009, quando trabalhei na redação do InfoMoney. Fiquei lá até 2018, me tornando chefe da redação e da TV do portal nos últimos anos. O crescimento do Infomoney ajuda a explicar a evolução do consumo à informação (ou vice-versa).
Nos meus primeiros anos lá, ter acesso a quem realmente fazia preço no mercado era uma regalia: gestores não falavam com jornalistas, relatórios não circulavam com a mesma facilidade de hoje e nós tínhamos que nos contentar a alguns porta-vozes pouco dispostos a falar com jornalistas:
“[NOME DO ANALISTA], por que a ação Fras-Le está subindo 20% neste mês?”
“Olha Thiago, acredito que tem muito mais gente querendo comprar do que vender esta ação, por isso ela sobe tanto”.
O caso acima pode parecer caricato, mas é verdade (óbvio que eu não escrevi isso na matéria) e retrata bem o que era o acesso à informação: os relatórios dos grandes bancos não chegavam com tanta facilidade, não existiam casas de análise independentes, as redes sociais não existiam… quem tinha informação, já tinha um diferencial.
Anos depois, com o advento das redes sociais (principalmente o twitter) e o surgimento de várias plataformas de notícias e de casas de análises independentes, o acesso à informação de qualidade deixou de ser algo só para os investidores profissionais e os grandes meios de comunicação e passou a ser mais democrático.
Os gestores de fundos, que pareciam evitar jornalistas e o investidor de varejo a todo custo, foram empurrados para o povão graças ao “financial deepening”, que deu aos investidores menos abastados o acesso a produtos melhores.
Com o Whatsapp e outros canais de comunicação, aí a coisa descambou: se você é bem relacionado e faz parte de alguns grupos, é possível ter acesso a diversos relatórios, jornais, informações em tempo real, tudo via “prints” ou até pelo PDF oficial. A “vantagem competitiva” do detentor da informação caiu por terra.
Isso é bom? Claro que sim! Mas tem uma consequência negativa que, pelo menos para mim, tem ficado cada vez mais óbvia nos últimos anos: o surgimento dos Traders de Whatsapp.
Trader de whatsapp é o cara que esquece que, para ganhar dinheiro de verdade na bolsa é preciso ler os balanços das empresas, os cadernos de notícias corporativas, gastar sola de sapato… fazer o “trabalho chato”.
Ele troca tudo isso pela sala do Café Ao Vivo, ou pelo influencer que encontrou a “Nova Magalu” (a de 2016, não a de hoje) e por puro altruísmo está vociferando esse call em todos os cantos para quem quiser ouvir. Os atalhos combinam muito mais do que as longas horas de estudo para essa sociedade ansiosa e imediatista que nos tornamos.
Há também o problema da dificuldade de separar qual notícia é importante e qual é um mero “ruído”. A dificuldade existe pois são justamente os “ruídos” que viralizam nas redes sociais, principalmente se a notícia é de política.
É inegável que em 2023 a Petrobras entregou muito mais do que o mercado esperava e o ministro Fernando Haddad fez um trabalho muito melhor do que o esperado (vale dizer que as expectativas eram baixas, mas mesmo assim ele tem seu mérito). No entanto, a quantidade de prints que rodaram grupos de whatsapp daqueles perfis anônimos do twitter que replicam notícias com comentários profundos como “Faz o L” ou “O Amor Venceu” ajuda a explicar por que tão pouca gente pegou o rali brasileiro de 2023. E não me limito apenas ao investidor amador: estou incluindo PRINCIPALMENTE os investidores profissionais. A cota não mente.
O fato é que, embora muitas vezes essa notícia não fosse pra fazer preço, ela era carregada com uma manchete horrível, que gerava indignação e, posteriormente, o compartilhamento. De repente uma notícia que nem era relevante foi o suficiente para inibir o apetite do investidor por risco, apenas pela enorme quantidade de compartilhamentos.
É tipo um efeito “Agência Mynd” só que no mercado financeiro: várias pessoas influentes comentando um mesmo assunto torna aquele assunto um viral.
A lembrar: a ação da Petrobras atingiu na última sexta-feira o patamar de R$ 40, sua máxima histórica na bolsa, acumulando ganhos de mais de 100% desde o final de 2022. Você consegue lembrar quantas notícias “negativas” sobre a empresa você recebeu em grupos de whatsapp?
Você pode discordar de mim, mas é assim que eu vejo as coisas: o excesso de informação deixou o investidor preguiçoso demais para ler as entrelinhas e consumir análises de verdade (é melhor ler 80 headlines de 1 linha cada do que 80 linhas de uma única matéria).
Nos tornamos mais imediatistas e ansiosos por informação e a falta de um bom filtro nos fez perder o discernimento do que é uma notícia que faz preço e o que é uma notícia para discutir na mesa de bar.
Eu, que sempre fui defensor e adepto do “hard news” pelo meu histórico profissional, hoje me atenho aos estudos que realmente importam, para evitar que os ruídos me façam tomar decisões precipitadas.
Ter ao lado um sócio como o Matheus Soares, que gosta mais de estudar do que eu gosto do Palmeiras, só me incentiva a isso.
“Math, Ibovespa caiu 1% hoje. Sabe o que aconteceu?”
“Saloma, provavelmente teve mais gente afim de vender do que comprar.”
Talvez aquele analista que entrevistei no início de carreira estava certo e já tinha me dado o sinal. E isso ajuda a explicar por que o Market Makers prefere ter um programa semanal f**a do que vários programas diários explicando cada oscilação de preço da bolsa.
Meu conselho a você, leitor: silencie o twitter, pegue leve nas redes sociais, assine uma boa casa de análise e uns jornais e bons estudos.