Às vésperas do segundo turno das eleições presidenciais de 2022, o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva escondia com afinco quais seriam suas diretrizes macroeconômicas caso fosse eleito.
Jogando no escuro, o mercado financeiro lhe cobrava um plano, mas dava o benefício da dúvida (ao menos publicamente): seu terceiro mandato poderia ser de mais ortodoxia fiscal, como foi o primeiro (2003-2006), ou de mais desenvolvimentismo, como o de Dilma Rousseff (2011-2014).
Era isso que ouvíamos em outubro, novembro e dezembro do ano passado.
Após 60 dias de mandato, está claro que o mercado financeiro já precifica Lula com Dilma. Para ser mais preciso: 73% como Dilma.
Dê uma olhada no gráfico abaixo, elaborado pela Studio Investimentos:
NTN-B entre 2010 e esta semana. O importante deste gráfico é perceber a distância entre o momento atual e o pico, de 2016
A linha laranja é a taxa da NTN-B para 2050; a azul, o mesmo título de 2030. Esse número é, na prática, quanto o mercado cobra de juros reais para emprestar dinheiro para o governo. Ele é uma excelente medida do que o mercado acha da capacidade de pagamento do Tesouro Nacional. Se algo no Brasil pode ser considerado um score de crédito do governo, isso é o que chega mais perto.
O ponto mais alto do gráfico, considerando a linha laranja, acontece no auge da crise do governo Dilma: 7,63% ao ano em 22 de setembro de 2015. No último dia 27, esse número era de 6,42%. O que pode ser interpretado como: o mercado já enxerga nesse governo 73% do risco que enxergava no governo Dilma.
(Como o risco nunca vai ser zero, nesse tipo de cálculo o mercado subtrai o mínimo do período, de 3,23%, resultando em [6,42 – 3,23] / [7,63 – 3,23] = 73,18%).
Nossa visão
Em grande medida, essa desconfiança maior do mercado financeiro foi construída pelo próprio governo.
Depois de sua posse, o presidente Lula resolveu opinar sobre a política monetária do Banco Central, questionar sua autonomia e as intenções “desse cidadão” Roberto Campos Neto, que mantém os juros em 13,75%. A isso soma-se a disputa entre a “facção Haddad” e a “facção Gleisi” do governo, a indicação de um político para a Petrobras entre tantos outros fatos e factoides.
O efeito no mercado fica evidente na tabela abaixo, também da Studio:
Se você comparar os pregões recentes ao primeiro dia após a eleição terminar, vai perceber que o mercado, após as eleições, previa juros mais baixos para o fim de seu mandato do que o que prevê hoje. Os números mostram, portanto, que a expectativa do mercado em relação ao governo piorou conforme ele começou a piorar. Em outras palavras, ficou claro que Lula está dilmando.