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Persiga o lucro

As três formas de uma ação gerar retorno ao acionista e o que a melhor e a pior ação do Ibovespa no ano nos dizem sobre expectativas.

Por Matheus Soares

02 ago 2022 10h49 - atualizado em 02 ago 2022 11h29

Ao comprar uma ação você busca um retorno acima do que teria se colocasse o dinheiro em um investimento de menor risco. Não faz sentido investir em uma ação com potencial para retornar 15% ao ano se uma renda fixa com rating AAA pagar a mesma coisa, por exemplo. Você poderia argumentar que taxas atrativas na renda fixa fazem parte de um ciclo que se encerrará em algum momento e que uma ação pode ter potencial para retornar 15% ao ano pra sempre. Mas não é óbvio admitir isso.

O retorno de uma ação pode vir de três formas: recebimento de dividendos, crescimento do lucro por ação e expansão de múltiplos. Ou seja, se você pagar R$ 1 milhão por uma empresa que gera R$ 100 mil de lucro e distribui esse montante aos acionistas, você estará recebendo 10% ao ano em dividendos.

Uma outra forma de analisar é através do múltiplo preço sobre lucro (P/L). Como é uma métrica aplicável a qualquer empresa lucrativa da bolsa, a comparação de preço entre elas é fácil. Contudo, uma empresa que negocia a P/L alto não necessariamente está cara, assim como o contrário também não é verdadeiro. O múltiplo alto é uma consequência da expectativa do mercado quanto à capacidade da empresa crescer lucros e não uma estimativa fiel de valor.

Em nosso exemplo hipotético, a empresa negocia a 10 vezes o lucro esperado (R$ 1 milhão / R$ 100 mil). Mas, se houver investimentos alternativos de mesmo risco ou até menor pagando 15% ao ano – ou seja, R$ 150 mil investindo o mesmo montante -, você deveria pagar um múltiplo até menor por ela. Algo em torno de 7 vezes o lucro esperado (R$ 1 milhão / R$ 150 mil). O contrário é verdadeiro, podendo até pagar um múltiplo maior se não tiverem melhores alternativas. Esse movimento de expansão e contração de múltiplos é muito comum na bolsa.

Por fim, a empresa pode surpreender e entregar um lucro maior que o esperado sem a necessidade de investimentos adicionais. Nesse caso, se a empresa entregar R$ 150 mil de lucro (50% a mais que o esperado) e continuar negociando a 10 vezes o lucro, seu valor de mercado na bolsa precisará corrigir 50% também, para R$ 1,5 milhão. Tão simples quanto isso.

Você deve estar se perguntando: tá, mas como essas três ferramentas de análise se combinam na vida real? Abaixo eu trago as maiores altas e baixas do Ibovespa no ano:

Fonte: Bloomberg

Mais precisamente vou pegar o exemplo da maior alta (Cielo) e a maior baixa (Meliuz). Para quem não sabe a Cielo é uma empresa de meios de pagamento e a Meliuz é uma empresa de cupons de desconto e cashback.

Falando primeiramente de Cielo, o gráfico abaixo ilustra bem o que justifica a forte alta no ano. Em vermelho temos a expectativa de lucro por ação do mercado e em branco o preço da ação. O que está acontecendo é que o mercado tem revisado pra cima a expectativa de lucro da empresa para 2022 e 2023 – reflexo dos juros mais altos, alívio da competição no setor, venda de ativos e margens mais altas.

Fonte: Bloomberg

Para se ter uma ideia, no quarto trimestre de 2021 a empresa superou em 36,5% a expectativa de lucro por ação do mercado e nas últimas quatro semanas tem sofrido sucessivas revisões pra cima do sell side.

Em linha com as melhores expectativas, o mercado passou a pagar mais pelo lucro da Cielo, o que também fez com que seu múltiplo P/L para 2023 expandisse de 6 para quase 10 vezes.

Fonte: Bloomberg

O inverso está acontecendo com a Meliuz. Nos últimos trimestres a empresa não conseguiu entregar o que o mercado esperava, levando a uma revisão pra baixo de lucros para os próximos anos.

Fonte: Bloomberg

Para piorar, por ser uma empresa de múltiplo alto que não correspondeu às expectativas do mercado, nos últimos meses o múltiplo P/L praticamente derreteu de quase 40 vezes para 13 vezes o lucro esperado para 2023. Ou seja, o lucro caiu e o múltiplo também.

Fonte: Bloomberg

Com esses dois exemplos podemos ter uma ideia do que o investidor está preferindo nesse ambiente de juros mais altos no Brasil e no mundo: empresas com potencial para crescer lucros em um ambiente adverso e negociadas a um múltiplo razoável e que “aceita desaforo”.

Idealmente, o que você quer é comprar uma empresa com potencial para crescer lucros acima do esperado, com baixa necessidade de investimento e com potencial de expansão de múltiplos, o que não vem sem uma boa execução por parte dos executivos do negócio.

Aqui no Market Makers estamos focados em encontrar essas boas assimetrias.

Food For Thought da semana:

Na última terça-feira (26), Howard Marks, um dos maiores investidores da atualidade, soltou o seu mais recente memo “I Beg to Differ”, na qual ele comenta sobre alguns dos seus maiores aprendizados no mercado. Inclusive, o memo acaba sendo um bom “resumo” para caso você não tenha lido suas outras cartas. Abaixo, destaco a frase que eu mais gostei dessa leitura e que diz muito sobre o atual momento da bolsa:

Se você esperar em um ponto de ônibus por tempo suficiente, é garantido que você pegará um ônibus, mas se você correr de ponto de ônibus em ponto de ônibus, você pode nunca pegar um ônibus.

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Por Matheus Soares

Fundador do Market Makers, analista responsável pela Carteira Market Makers de Ações. Antes de fundar o MMakers, foi analista responsável pela cobertura de Small Caps na XP Inc e analista fundamentalista da Rico Investimentos. Certificado no curso de Value Investing da Columbia Business School.

matheus.soares@mmakers.com.br