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Quantas vezes você muda de ideia?
Por que é tão importante entender a visão dos outros
Com qual frequência você muda de ideia? Todo dia, toda semana, uma vez por mês?
Confesso que, da mesma maneira que nunca havia me questionado sobre o quanto penso no Império Romano, também nunca havia pensado sobre qual é a frequência com a qual eu mudo de ideia.
Isso até me deparar com esta entrevista de Marc Randolph, fundador e primeiro CEO da Netflix, ao Collaborative Fund.
A pergunta feita a Randolph foi direta e simples: “Sobre o que você mudou de ideia recentemente?”
A resposta, um pouco mais complexa: “Há alguns anos eu decidi que tentaria mudar de ideia sobre alguma coisa pelo menos uma vez por mês, e isso se mostrou muito fácil. Comecei com a política — somos [os Estados Unidos] uma nação polarizada (…) dividida em 50/50, não é razoável que 160 milhões de pessoas estejam totalmente erradas”, afirma.
Randolph conta que, daí em diante, começou a ter uma postura ativa de se questionar e entender todos os argumentos, como se precisasse debater um tema, sem saber antes qual lado teria que defender. “Quanto mais eu fazia isso, mais eu percebia o quanto minhas opiniões eram rasas. E o quanto esse procedimento serve para todo tipo de questão”, diz Randolph.
Perceba o que ele disse no final: ”todo tipo de questão”.
Esse jeito de pensar do fundador da Netflix me chamou muito a atenção porque parece muito adequado para quem investe. Principalmente em ações.
Investir é uma arte/ciência que leva em conta um sem-número de variáveis que mudam o tempo todo. Dólar, inflação, atividade econômica, política, moda, taxa de juros, geopolítica, executivos, são só algumas delas. Parece razoável portanto dizer que mudar de ideia seja condição necessária para ganhar dinheiro.
Aliás, a própria Netflix é protagonista de um excelente exemplo de como a teimosia poderia destruir valor para os investidores.
Lá pelo ano de 2021 surgiu a Guerra do Streaming. A narrativa predominante era a de que a Disney destruiria a Netflix com seu serviço, o Disney+, já que teria melhores séries e a possibilidade de se associar aos streamings esportivos da ESPN, também propriedade da desafiante do mercado. Muita gente comprou essa ideia e se jogou nas ações da Disney.
Dois anos depois, a Netflix se provou muito mais resiliente do que se imaginava, e ainda hoje tem as séries originais mais vistas entre streamings, enquanto seus desafiantes (além da Disney, a HBO), não corresponderam às expectativas do mercado em número de hits, de assinantes e de rentabilidade. Hoje eles até licenciam parte de seu conteúdo para a Netflix. Mudar de ideia, nesse caso, era fundamental para os investidores de Disney.
Mas a parte que mais tem a ver com investimentos me parece o resultado final que esse jeito de pensar trouxe para Randolph: “Eu não gasto mais meu tempo pensando sobre por que eu estou certo. Agora eu gasto meu tempo tentando entender por que os outros acham que estou errado.”
Essa parte da entrevista me lembrou um processo que o João Braga, da Encore, explicou que implantou em sua gestora. Ele — que costuma pregar que “gestor é pago para mudar de ideia” explicou no episódio 59 do Market Makers que todos os analistas da casa precisam responder a um questionário no qual uma pergunta se destaca: o que as pessoas que discordam de você acham?
Mudar de ideia e pensar como seus “antagonistas” só pode trazer benefícios para o investidor. Como mostra Randolph, entender o jeito como os outros enxergam as coisas é muito mais proveitoso do que apenas reforçar o que você pensa e porque está certo, pois é nesse processo que você descobre como pode estar errado, o que pode não dar certo em um investimento, e até seus próprios vieses. Como diz o ex-CEO e fundador da Netflix: “é libertador”.