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Selic chegará a 14% em breve e a economia desbalanceou

"Com a taxa Selic nesse nível, a economia deve desacelerar, o desemprego deve começar a subir, e veremos um impacto mais claro no PIB a partir do segundo semestre de 2025"

Por caio.nascimento

10 Jan 2025 11h00 - atualizado em 10 Jan 2025 11h00

No episódio #158 do Market Makers Podcast, recebemos Pedro Jobim, economista-chefe e sócio-fundador da Legacy Capital, gestora com mais de R$ 20 bilhões em ativos sob custódia.

O Legacy Capital FIC FIM, um de seus fundos, acumula 95% de retorno desde sua criação, há 6 anos, superando o CDI e o Ibovespa no período.

Com mais de 20 anos de experiência na Bolsa e Ph.D. em Economia pela Escola de Chicago (um dos principais pilares modernos do liberalismo econômico), Jobim é uma das vozes mais respeitadas no mercado financeiro brasileiro. 

Durante a conversa de 1h30 com Thiago Salomão, Jobim traçou uma análise minuciosa das perspectivas econômicas do Brasil, abordou as tensões geopolíticas globais, comentou sobre a situação econômica dos EUA e da Europa, crescimento da dívida brasileira, o futuro do mercado de ações na B3, e até reflexões sobre as narrativas da cultura woke.

Abaixo, trago 3 tópicos em que ele explica por que a Selic chegará a 14% (o mínimo para tentar evitar um descolamento ainda maior das expectativas de inflação, na visão da Legacy) e por que a economia está desbalanceada, mesmo com PIB crescendo acima das expectativas.

1) Aquecimento econômico e dilemas fiscais

Jobim comparou o atual momento econômico do Brasil com o que os Estados Unidos vivenciaram até cerca de um ano atrás. Segundo ele, o Brasil está em um ciclo de sobreaquecimento, impulsionado por estímulos fiscais contínuos iniciados em 2022 e mantidos até 2024. 

Esse impulso tem se refletido em indicadores como níveis recordes de ocupação e crescimento de massa salarial.

“Estamos vivendo um cenário de desemprego muito baixo, em torno de 6,5%, o que vimos poucas vezes no passado. O mercado de trabalho está superaquecido, com indicadores como a taxa de abandono voluntário de empregos [‘quit rate’] ainda bastante altos. Isso demonstra a força desse aquecimento econômico, algo que os Estados Unidos também enfrentaram há pouco tempo”, explicou.

Entretanto, ele ponderou que o Brasil enfrenta um descompasso estrutural, com um déficit fiscal significativo e uma dívida pública que cresce em ritmo alarmante.

“Hoje, nossa razão dívida/PIB cresce cerca de quatro a cinco pontos percentuais por ano, enquanto o PIB cresce apenas três. Isso mostra que a economia está muito desbalanceada”, alertou.

2) A ‘sombra’ do ano eleitoral e o que Lula fará com as despesas 

Jobim detalhou os desafios do governo em conter a escalada da dívida pública sem comprometer o apelo eleitoral de 2026. Para isso, o economista trouxe dois pontos fundamentais: a diferença entre despesas obrigatórias — aquelas fixadas por lei, como previdência, salários de servidores e benefícios sociais — e despesas discricionárias, que são mais flexíveis, incluindo investimentos e emendas parlamentares.

“O governo tem poucas margens de manobra. Hoje, o ajuste que se tenta fazer é reduzir o crescimento das despesas obrigatórias, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC), ou limitar reajustes do salário mínimo à inflação mais 2,5%. No entanto, qualquer impacto mais significativo só seria sentido em 2027, devido ao tempo de implementação dessas medidas.”

Ele alertou que, caso nenhuma ação seja tomada, o governo terá de cortar entre R$ 35 bilhões e R$ 40 bilhões em despesas discricionárias em 2026, ano eleitoral.

Ou seja, será muito difícil Lula passar o facão nesses valores numa tentativa de reeleição ou de emplacar um sucessor. 

“O que o governo Lula vai tentar fazer é reduzir um pouco as despesas obrigatórias, para evitar cortes mais profundos nas despesas discricionárias em um ano de eleição. No entanto, em termos de resultado primário e crescimento da dívida, o impacto será praticamente o mesmo”, afirmou o sócio-fundador da Legacy, apontando que o ajuste buscado pelo governo visa mais à adequação do arcabouço fiscal do que a uma redução efetiva dos gastos.

3) Projeção de Selic a 14% e papel do Banco Central

Na visão de Jobim, o Banco Central demorou para subir os juros, com um ritmo de ajuste insuficiente para conter o avanço dos preços. 

“Quando iniciou, fez movimentos muito tímidos, como os aumentos de 25 e 50 pontos-base, que foram insuficientes. Agora estamos vendo uma situação onde as expectativas de inflação estão desancorando”, analisou.

A Legacy Capital projeta que a inflação deve ficar entre 5,5% e 6% em 2025, significativamente acima da meta de 3% e do teto de 4,5%. Para Jobim, isso obrigará o Banco Central a adotar uma postura mais agressiva nas próximas reuniões.

“É praticamente impossível que o Banco Central não acelere o ritmo de alta de juros, subindo 75 pontos-base em dezembro e sinalizando outra alta similar na sequência. Trabalhamos com um cenário em que a taxa Selic chega a 14% como o mínimo necessário para evitar um descolamento ainda maior das expectativas inflacionárias”, afirmou.

Ele também destacou o impacto dessa política na economia real, apontando que o objetivo central é conter o superaquecimento econômico. “Com a taxa Selic nesse nível, a economia deve desacelerar, o desemprego deve começar a subir, e veremos um impacto mais claro no PIB a partir do segundo semestre de 2025. O Banco Central precisa fazer isso para tentar reancorar as expectativas e preservar sua credibilidade”, concluiu.

E aí entra uma outra questão apontada por Jobim: o que Lula irá fazer quando o desemprego começar a subir e a desaceleração econômica se tornar visível? Qual será a reação do governo? Será que a resposta será mais gastos para estimular a economia? Isso ocorrerá num timing  crítico, no qual as eleições estarão no horizonte.

Por hoje é isso

O episódio completo está disponível aqui

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