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Sr. Mercado, Margem de Segurança e ROIC: os 3 pilares da análise fundamentalista
Depois de receber 38 respostas na newsletter anterior, eu não poderia deixar de escrever sobre os três tópicos que me comprometi com vocês: (i) o que faz as ações subirem ou caírem de preços diariamente, (ii) o ponto ótimo de compra de uma ação e (iii) um dos indicadores mais importantes para se atentar em uma análise de empresa.
Vou resumi-los como: i) Senhor Mercado, ii) Margem de Segurança e iii) Retorno sobre O Capital Investido.
Antes de falar sobre eles, queria registrar um agradecimento especial a todos – bem mais que os 5 leitores que eu imaginava – que não só leram até o último parágrafo da última CompoundLetter como também responderam ela com um carinhoso “eu quero”. Valeu D+.
Caso não tenha lido a newsletter anterior (cinco verdades que você precisa saber antes de comprar uma ação), recomendo: o conteúdo de hoje é complementar ao de semana passada. Se não leu, mas quiser arriscar, não passe vontade.
Até aqui, o que você precisa saber é isto:
- Comprar uma ação de uma empresa significa que você está adquirindo uma fração daquele negócio. Com isso, você tem direito a uma porção dos lucros futuros daquela empresa.
- Para saber o valor de uma empresa é preciso estimar (ou, adivinhar) o quanto ela será capaz de ganhar no futuro.
- O retorno da ação com os lucros da empresa deve render mais dinheiro do que se investisse a mesma quantia em um investimento conservador, geralmente o título de dívida de longo prazo do país.
Agora, vamos voltar ao exemplo da academia de musculação citado na semana passada: diversos investidores – inclusive o personal trainer – toparam pagar 8 reais por ação, avaliando o negócio por 8 milhões de reais (um milhão de ações multiplicado por 8 reais) e a academia XYZ passou a ser listada na bolsa de valores.
A negociação de compra e venda dessas participações ocorre da maneira que o investidor preferir: online ou por ligação telefônica com a intermediação de uma corretora. Toda essa atividade de compra e venda é chamada de mercado de ações.
Como as ações são negociadas de segunda a sexta, as pessoas que as compraram podem passar a vendê-las quando quiserem a qualquer um. É por conta disso que as ações variam de preço, podendo ir de 8 a 16 reais com alguma facilidade e depois cair para 4 reais com a mesma rapidez.
Por que isso acontece?
Aqui chegamos ao primeiro tópico da conversa de hoje:
1) Senhor Mercado
Talvez as pessoas não durmam tão bem quanto deveriam. Talvez seja difícil estimar os lucros futuros. Talvez as pessoas fiquem meio deprimidas em algumas ocasiões e não queiram pagar muito por alguma coisa. Talvez as pessoas se empolguem demais e, com isso, aceitem pagar muito pela mesma coisa. O mercado é feito por humanos e talvez as pessoas justifiquem os preços mais altos fazendo estimativas elevadas de lucros futuros quando estão felizes; e justifiquem os preços baixos fazendo estimativas pessimistas quando estão tristes.
A verdade é que não tem como saber por que as pessoas se dispõem a comprar e vender ações da maioria das empresas por preços absurdamente diferentes em intervalos de tempo tão curtos. Mas a verdade é que elas fazem! E saber isso é importante.
O pai da análise fundamentalista e um dos maiores pensadores sobre o mercado de ações, Benjamin Graham, tinha uma boa explicação para isso. Imagine que você é sócio de um negócio junto com um sujeito maluco chamado sr. Mercado. O sr. Mercado é propenso a loucas variações de humor. Todo dia ele se oferece para comprar suas ações ou vender a você, por determinado preço, as ações que ele tem de uma empresa. O sr. Mercado sempre deixa a decisão do seu lado e, diariamente, você tem três opções: pode vender suas ações para o sr. Mercado ao preço que ele definiu, pode comprar as ações do sr. Mercado por esse mesmo preço, ou pode não fazer nada.
Às vezes, o sr. Mercado está tão de bom humor que estipula um preço muito mais alto do que o verdadeiro valor do negócio. Nesses dias, provavelmente faria mais sentido se você vendesse ao sr. Mercado suas ações. Em outros dias, ele está de tão mau humor que coloca o preço lá embaixo e então você pode se aproveitar da maluquice dele para comprar ações por uma barganha. Se o preço oferecido pelo sr. Mercado não é nem muito alto nem muito baixo, é melhor não fazer nada.
O mercado de ações é o sr. Mercado, mas lembre-se: você não é obrigado a agir. Seu maior balizador para saber quando agir é a margem de segurança – nosso segundo tópico.
2) Margem de segurança
Você vai comprar ou vender uma ação quanto maior ou menor for a sua margem de segurança.
Imagine que a ação da academia XYZ saiu de 8 reais para 4 reais. Se você acha que a ação deveria valer 10 reais, sua margem de segurança ao comprar nos 4 reais é de 6 reais. Se a sua estimativa do valor da ação for alta demais ou se o negócio de academias sofrer um revés inesperado após a sua compra, a margem de segurança do seu preço de compra original ainda pode protegê-lo de perder dinheiro.
Mesmo que você tivesse estimado o valor justo em 8 reais e depois verificasse que 7 ou 6 reais fosse um valor mais correto, um preço de compra de 4 reais seria uma margem suficiente para você ainda ganhar dinheiro com seu investimento original.
Portanto, se você ficar firme e só comprar boas empresas (aquelas que oferecem alto Retorno sobre O Capital Investido – ROIC), e só as comprar a preços irrisórios com ampla margem de segurança, você poderá comprar participações em boas companhias das quais o sr. Mercado se livrará.
Comprar ações de um bom negócio é melhor do que comprar ações de um mau negócio. É aqui que entra o terceiro tópico: ROIC.
3) Retorno sobre O Capital Investido (ROIC)
Por que as companhias que têm alto retorno sobre o capital são tão especiais?
Vamos voltar ao exemplo da academia XYZ.
Após conseguir o dinheiro dos acionistas, o plano da XYZ é crescer sua rede de academias para outras regiões. A academia que ela já tem gera 1 milhão de reais e seu plano de investimento é investir os 4 milhões captados em duas novas academias (2 milhões cada).
O investimento de 2 milhões é o mesmo que a XYZ teve que fazer na sua atual academia. Ou seja, como o investimento foi de 2 milhões (incluindo máquinas de musculação, piscina etc.) e o negócio retorna 1 milhão por ano, isso significa que o retorno sobre o capital para abrir uma academia foi de impressionantes 50% (1 milhão divididos por 2 milhões).
Se a primeira academia serve de bom indicador e se a XYZ realmente consegue lucrar 50% ao ano abrindo uma nova academia, isso faz com que o negócio seja especial. É raro encontrar algo que retorne 50% ao ano, embora não exista garantia alguma que isso vá se repetir.
Ou seja, a academia tem uma opção muito melhor do que simplesmente deixar o dinheiro no banco rendendo ‘CDI’. A companhia pode utilizar o dinheiro captado para crescer e investir o lucro delas rendendo 50% ao ano.
Vamos supor que o investimento de 4 milhões nas duas novas lojas geraram o retorno esperado e hoje a XYZ consegue lucrar 3 milhões de reais por ano com suas três academias.
Se a XYZ pegar os 3 milhões de reais e investir numa nova academia que ganhe 50% de retorno anual, os lucros da rede serão de 4,5 milhões no próximo ano (3 milhões das lojas originais e mais 1,5 milhão da nova loja). Partir de 3 milhões no último ano e chegar a 4,5 milhões de reais no próximo ano representa um crescimento de 50% em um ano!
Ser dono de um negócio que tem a oportunidade de investir uma parte dos lucros – ou todo ele – com alto índice de retorno pode contribuir para um crescimento dos lucros numa velocidade também muito alta.
Agora que você foi apresentado a esses conceitos, eu diria que você acabou de conhecer uma parte importante do nosso processo de investimento.
A gente adora comprar empresas que o sr. Mercado não esteja querendo, que ofereçam algum grau de margem de segurança e que sejam empresas capazes de reinvestir parte dos lucros no próprio negócio, ampliando suas vantagens competitivas e entregando resultados acima do esperado.
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