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Você também pagará pela indústria naval

Governo pretende criar outra vez projeto que já se provou um fracasso

Por Renato Santiago

09 May 2023 16h31 - atualizado em 09 May 2023 04h52

“Cada geração de empresários paga a sua conta da indústria naval brasileira.”
— André Esteves

O Museu de Grandes Novidades do Brasil acaba de ganhar mais uma obra: A Retomada da Indústria Naval.

Seu retorno já era dado como certo tendo em vista o que diz o PT sobre ela e as declarações que o presidente Luiz Inacio Lula da Silva já havia dado anteriormente. Quem cortou a fita na inauguração da obra foi o novo presidente da Transpetro, Sérgio Bacci.

“Chego à Transpetro com essa missão de retomar a construção de navios em estaleiros brasileiros”, disse no último dia 4. Se a declaração de Bacci não diz tudo sobre as intenções do governo para a subsidiária da Petrobras, seu currículo o faz. Ele é ex-vice-presidente do Sinaval, o sindicato da indústria naval.

Apreciar esse tipo de obra é difícil para mim pois eu estava na mesa quando o Market Makers recebeu o Marcos Mendes, doutor em economia e pesquisador do Insper. Ele nos demonstrou que projetos desse tipo já nascem de premissas erradas e velhas.

“Existe um pensamento, que vem da Cepal, lá dos anos 1940, de que crescimento econômico e prosperidade quem faz é o governo. O governo é que tem que puxar o crescimento, estimular a demanda. Uma ideia de que o governo é que tem capacidade de saber quais setores puxarão a economia e portanto receber financiamento subsidiado”, resume Mendes.

Governos infelizmente não conseguem fazer isso, e, ironicamente, a provar é o próprio setor naval. No episódio 24 do Market Makers, Marcos Lisboa, então presidente do Inper, usou as tentativas do governo PT de transformar o Brasil numa potência de estaleiros como exemplo de como iniciativas assim acabam por se tornar uma coleção de favores a empresários que só criam indústrias pouco competitivas e produtos ruins.

“Se você é o governo que cuida da indústria naval, você está distribuindo os benefícios e você não faz a conta do efeito delegado. Na hora que você subsidia, quem compra navio vai pagar mais caro e o navio vai ser de pior qualidade. E você vai deixar de fazer outra coisa, vai largar estrada, portos… Será que o saldo líquido é positivo ou negativo? Nos casos que conheço a contas é bem negativa para o país”, explica Lisboa.

Entendo que as opiniões dos nossos dois convidados podem não ser suficientes para você, portanto vamos aos fatos. Hoje, os estaleiros que eram símbolo da retomada da indústria naval nos governos do PT de Lula e Dilma, como Atlântico Sul, Ecovix e Enseada estão em recuperação judicial, conforme esta reportagem do Valor. Isso mesmo tendo recebido R$ 18,7 bilhões do BNDES.

Não se trata aqui de uma perseguição aos estaleiros ou navios. Não temos nada contra eles. Mas se trata de querer que o governo aprenda e dessa vez conduza uma boa e justa alocação do dinheiro público, pois, se o governo fizer de novo o que já fez — subsídios que resultam em empresas incompetentes — o resultado será o mesmo: falência, recuperação judicial e navios que não flutuam direito.

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Por Renato Santiago

Jornalista, co-fundador do canal Market Makers e do Stock Pickers, duas vezes eleito o podcast mais admirado do Brasil. Passou por grandes redações do país, como o jornal Folha de S. Paulo e revista Exame, e atuou na cobertura de diferentes temas, de cotidiano até economia e negócios. Sua missão, hoje, é a de usar sua expertise editorial e habilidades de reportagem para traduzir o mundo das finanças e mercado financeiro ao grande público.

renato.santiago@empiricus.com.br