Notícia

8min leitura

icon-book

Um otimista e um pessimista entram num bar…

É para comprar ou vender?

Thiago Salomão

Por Thiago Salomão

22 Jan 2024 09h51 - atualizado em 22 Jan 2024 09h51

Um otimista e um pessimista entram num bar…

Conversa totalmente fictícia. Qualquer semelhança dos personagens com alguma pessoa real é mera coincidência. Se alguém se ofender, sugiro uma visita a um psicólogo.

Otimista: Fala meu amigo. Feliz ano novo! Que seja um ano excelente pra você.

Pessimista: Ano excelente? Em que planeta você vive?

Otimista: Calma, já tá bêbado? Não é nem 17h.

Pessimista: Como ficar calmo depois dessa disparada sem sentido do “Senhor Mercado” no final de 2023? Saímos de “parece barato” para “bem vindo ao mundo encantado dos Ursinhos Carinhosos” em dois meses! Foi um “puxa cota” de gestor que não acabava mais. Agora estamos pagando a conta em 2024. E tá apenas começando!

Otimista: Pera, você não tá comprado em ações?

Pessimista: COMPRADO?!?! Eu tô é short até as tampas. Soft landing nos Estados Unidos com surpresa fiscal no Brasil?! Pelamor de Deus. Ah, mas relaxa que a Balança Comercial e os dividendos da Petrobras vão nos salvar….Ô Josias, enche aqui meu copo de whisky, por favor!

Otimista: Cara, relaxa. Você tá mais rabugento que o twitter do Faria Lima Elevator. Eu sei que mostrar-se pessimista tem seu charme e um ar de inteligentão, mas reclamar de tudo é chato pra caramba. Por isso você tá aqui bebendo sozinho!

Pessimista: Ah eh?!?! Então me diz como ficar otimista? Tirando a Miriam Leitão, não imagino ninguém que possa explicar como isso tudo pode ser uma boa notícia.

Otimista: First things first. Passamos pelo maior ciclo de aperto monetário das últimas décadas. Aqui a taxa de juros foi de 2% pra quase 14%. Lá fora foi de zero pra 5%. Inflação arrancou o coro de todo mundo. Agora, isso ficou pra trás: inflação não é mais um problema insolúvel e a taxa de juros vai voltar a cair. E o que acontece quando os juros caem?

Pessimista: Você vai dizer “a bolsa sobe”, mas vej….

Otimista: Essa é a forma simples de resumir, mas vai além disso. Juro mais baixo estimula o investimento em tudo, não só na bolsa! O dinheiro tem que trabalhar pra render, não pode ficar parado na renda fixa. Isso estimula empreendimentos, projetos, aquece o mercado de capitais… Todo empresário ambicioso que teve seus planos limados nos últimos tempos pelo juro alto vai sair da jaula. É o animal spirit que vai voltar! 

Pessimista: Concordo com o animal. Só um animal mesmo pra se empolgar com isso.

Otimista: Mas o que te preocupa tanto, margarido?

Pessimista: Bom, acreditar que a situação dos EUA está resolvida beira a ingenuidade. Você já viu o gráfico de crescimento da dívida americana pós-pandemia? Só não é mais preocupante do que aquele gráfico da NASA mostrando o aumento da temperatura global nos últimos anos. A chance do mundo acabar antes da dívida americana explodir é o único motivo que vejo para ficar comprado…

Otimista: Mas timing é tudo no mercado: estar certo na hora errada significa estar errado. Se a dívida americana não explodir, vai perder um grande cavalo.

Pessimista: Tá, esquece os EUA e olha pra China: lá onde cada dado econômico é uma “caixa preta” só vem notícia negativa. Se o que está sendo divulgado é ruim, imagina como tá a situação de verdade? Quanto pior estiver a situação na economia, maior a chance do Xi anexar Taiwan pra tirar o foco do fracasso econômico do país.

Otimista: Olha, de China eu não entendo, mas quanto mais a Vale cai com isso, mais eu estou comprando.

Pessimista: Comprar Vale?!?! Com Guido Mantega entrando no Conselho e almejando virar CEO? Era só o que me faltava. Ou “fez o L” ou tá maluco.

Otimista: Mas o que tem a ver o Mantega com a queda da Vale?

Pessimista: Vale caiu mais do que BHP e Rio Tinto. É claro que foi por causa do Mantega!

Otimista: Rapaz… Vale negocia a 4x EV/Ebitda de 2024 e vai gerar um caminhão de dinheiro esse ano, deve entregar uns 13% de “yield” via dividendos e recompra de ações. Isso tudo já botando na conta o minério nos preços atuais e sem contar o maior pacote de estímulo chinês do século que foi anunciado agora. O que o conselheiro Mantega pode fazer para impedir isso? Nessas horas a matemática me ajuda a não agir por impulso e vender a qualquer ruído. In carrego we trust.

Pessimista: Vocês otimistas querem ver beleza em tudo. Como já disse muito bem Rogério Xavier, eu não sou pessimista, eu sou REALISTA e a realidade hoje é terrível! Não só pela fotografia mas principalmente pelo comportamento do mercado: tá todo mundo otimista. E isso me deixou louco!

Otimista: Mas o mercado é essa alternância de ciclos e de humor. Não lembra o começo de 2023? Não tinha uma alma aqui na Faria Lima otimista com o mercado. Era risco de recessão nos EUA com Lula raivoso no Brasil colocando em risco o futuro fiscal. No final do dia, o que conta mesmo é o posicionamento técnico: 2023 não foi um ano maravilhoso, mas como o mercado estava todo apostando no pior, os preços andaram muito a cada notícia positiva.

Pessimista: Ok. Bela análise de retrovisor. Mas e agora, você não acha que a balança toda está pendendo pro lado exageradamente otimista?

Otimista: Encontramos um ponto de equilíbrio: concordo que, na gangorra do mercado, tem mais peso no lado otimista do que pessimista. Mas há bons motivos pra isso.

Pessimista: Não consigo ver seus bons motivos. Queda de juros nos EUA e mundo afora? Sim, é um bom motivo, mas é só isso. Subalocação de dinheiro em renda variável não é “motivo”, porque Selic perto de 10% ainda é bom negócio pra rentista que tem acesso a produtos isentos de IR e com proteção do FGC. Se você me mostrar um assessor de investimentos motivado a trocar as CRIs e CRAs dos clientes pros fundos de ações, eu pago teu próximo chopp!

Otimista: Não subestime um fluxo de dinheiro em busca de yield. Muitos fundos de ações tiveram um 2023 bastante positivo e não estamos nem no começo dos efeitos do ciclo de queda de juros. E olha, não é porque eu sou otimista, mas nossa economia tem surpreendido consistentemente as projeções dos economistas. E se a economia vai bem, imagina as empresas da bolsa, que são a “Champions League” do nosso capitalismo?

Pessimista: Não sei se é o whisky ou o seu discurso de Miss Universo que está me dando dor de cabeça, mas deixa eu te lembrar o que o Sandro Sobral escreveu recentemente: o mercado não tem gás pra continuar subindo depois da alta artificial de dezembro. Já “crowdeou” geral, veio todo mundo pra bolsa ao mesmo tempo e não tem gatilho novo pra fazer subir. Não vai ter um novo Temer, uma nova Reforma da Previdência… isso sem contar a cacetada de incertezas: tensões geopolíticas, o fiscal do Brasil, a China…

Otimista: Enquanto isso o S&P renova máximas históricas… e você vendido em bolsa.

Pessimista: Renovou às custas do Magnificent 7! Se tirar Nvidia e todas as outras, onde estaria o S&P?

Otimista: Mas o “se” não entra em campo. Se minha avó tivesse rodas, ela seria uma bicicleta. E outra: você cita o Sobral pra justificar seu pessimismo, mas o próprio Sobral escreveu na última semana que o mercado estava próximo do pico de pessimismo. Não se esqueça do “first things first”: juros terão que cair, mundo afora e aqui.

Pessimista: Você pode argumentar o que quiser, mas estruturalmente falando o Brasil é “short” na maior parte do tempo, com alguns lampejos “longs”. Subimos em 2023 junto com o mundo todo e vamos ficar na mediocridade com o resto do mundo em 2024. E aqui eu estou sendo otimista, porque quando caírem na real que o problema fiscal brasileiro foi apenas empurrado com a barriga, é bolsa pra baixo e juro pra cima.

Otimista: Você está exagerando. Ibovespa pode parecer “alto”, mas não está caro. Isso sem contar que esse rali do Ibovespa foi muito puxado por Petro e Vale, ou seja, tem muita coisa ainda mais barata. Então você soma empresas baratas com bons resultados num ambiente de juros em queda, inflação ancorada e PIB crescendo. A pergunta é: como não ficar otimista?

Pessimista: A resposta é simples: basta olhar dois anos à frente e tentar encontrar uma solução razoável para o fiscal brasileiro, dos EUA e as tensões geopolíticas mundo afora.

Otimista: Você precisa ouvir o Market Makers do final do ano passado com o Bruno Serra, da Itaú Asset. Ele explicou claramente por que as coisas têm grande chance de dar certo em 2024.

Pessimista: Eu ouvi inteiro. Por que você acha que estou pessimista? No final de 2022, o Market Makers entrevistou o Felipe Guerra da Legacy e o cenário era tão pessimista que só faltaram os violinistas do Titanic. Daí você viu o que aconteceu na bolsa em 2023…

Otimista: Deixa eu ver se eu entendi: você opera fazendo o contrário do que os gestores falam nos podcasts?

Pessimista: Tá me chamando de burro? Claro que não. Sei bem a diferença entre coincidência e causalidade. Mas sempre que vejo uma opinião tão convicta sobre algo do mercado, me questiono o que pode acontecer se o consenso “comprar” esta opinião e ela estiver errada…

Otimista: Gostei deste jeito de analisar o efeito do que é dito nos podcasts. Vou dar esse toque pro Salomão. Gente fina ele, aliás. Já falou com ele?

Pessimista: Sai pra lá esse tal de Salomão. Muito otimista…

Compartilhe

Thiago Salomão
Por Thiago Salomão

Fundador do Market Makers, analista de investimentos CNPI-P, MBA em Mercados Financeiros na Fipecafi e na UBS/B3. Antes de fundar o MMakers, foi editor-chefe do InfoMoney, analista de ações na Rico Investimentos, co-fundou o podcast Stock Pickers e foi sócio da XP de 2015 a 2021

thiago.salomao@mmakers.com.br