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7min leitura

A resposta de Stuhlberger à pergunta que ninguém fez

Um novo futuro pra Verde? Uma análise sobre o rumor mais importante da indústria de fundos

Por Thiago Salomão

13 mar 2023 16h53 - atualizado em 13 mar 2023 04h53

Num fim de semana em que todos os financistas vestiram o jaleco de “especialistas em Silicon Valley Bank”, minha CompoundLetter não poderia ser de outro tema. Até que uma notícia publicada na noite de domingo no Brazil Journal mudou completamente meu foco (felizmente), e reduziu minhas horas de sono (infelizmente).

notícia é sobre a (ainda não confirmada) venda de cerca de 30% da Verde Asset, de Luis Stuhlberger, para a Lumina Capital Management, gestora de crédito e special situations de Daniel Goldberg, uma das maiores referências do assunto no Brasil. O Credit Suisse, sócio da Verde, venderá uma parte do que tem para a Lumina, apurou o Brazil Journal.

Esse acordo (se confirmado) pode ser de extrema importância para quem acompanha o dia-a-dia dos fundos no Brasil, pois ele vem justamente num momento em que muitos profissionais desta indústria (alocadores, analistas de fundos, gestores de FOFs) têm dúvidas sobre se a Verde continuaria assistindo de forma passiva à onda de resgates que tem tomado nos últimos meses. A notícia mostra uma clara (e surpreendente, vale dizer) resposta de Stuhlberger.

Para deixar todos os leitores no mesmo nível, vamos primeiro apresentar quem é Luis Stuhlberger, o que é o fundo Verde e o que tem acontecido com ele nos últimos anos, para depois explicar melhor o racional por trás deste negócio.

Stuhlberger, Verde Asset e Fundo Verde: quem são

Luis Stuhlberger é o gestor do Fundo Verde, um dos melhores e mais longevos “hedge funds” brasileiros. Desde seu nascimento, em 1997, o Fundo Verde acumula rentabilidade de 21.932%, contra 2.681% do CDI.

Nestes 26 anos completos de cota, o Verde fechou no negativo em apenas 2 anos (-6,4% em 2008 e -1,1% em 2021). Nos outros 24 anos positivos, ele perdeu do CDI em 2 anos: 2014 e 2017. No restante, só retorno positivo e acima do CDI.

Você pode até ter outros fundos preferidos, mas é indiscutível que Stuhlberger é o gestor há mais tempo entre os melhores do Brasil. Além disso, ele foi o precursor do que hoje chama-se de “multimercado” – antes do Verde, o mercado era basicamente dividido entre renda fixa e ações. O sucesso do Verde abriu um novo mundo para alocadores, investidores, profissionais etc.

O mercado como um todo deve muito ao Stuhlberger, foi ele quem fez as coisas acontecerem quando “isso tudo era mato”.

Uma outra proeza que nem todos sabem: em 2014, a Verde devolveu quase R$ 5 bilhões aos seus cotistas, por considerar que estava “grande demais para o mercado” naquele momento. Atitude extremamente louvável, pois dessa forma ela abriu mão de um ganho milionário garantido que entraria via taxa de administração.

Performance mediana por um, dois… cinco anos?

Mas já diz a grande máxima do mundo dos investimentos: rentabilidade passada não é garantia de retorno futuro. Até nossos heróis precisam ser questionados quando precisamos de respostas. 

Apesar de bater consistentemente o mercado desde 1997, o fundo Verde tem tido uma performance aquém do esperado: além de ter ficado apenas um pouco acima do CDI nos últimos anos, ele tem ficado pra trás de outros multimercados de importantes casas independentes do Brasil. Veja abaixo um levantamento com 9 fundos com características semelhantes ao Verde (dados de julho/2018 até março/2023).

Performance de jul/2018 até fev/23 de 9 fundos multimercados e do CDI (fonte: Mais Retorno).

A performance aquém não se restringe apenas ao carro chefe da casa: a estratégia de previdência VERDE AM ICATU PREV FIC FIM ficou praticamente no zero a zero no biênio 2021-2022, contra +17% do CDI. Já o VERDE LONG BIAS não só caiu forte no mesmo biênio (-18% em 2021 e -16% em 2022) como ainda viu a saída de Pedro Salles, gestor da estratégia de ações e um dos principais sócios da Verde, no final de 2022. Para o seu lugar, a Verde contratou Elmer Ferraz, que estava na Itaú Asset desde 2015.

Resgates e perda do pódio

O desempenho abaixo dos seus pares trouxe impactos na captação. A Verde Asset sofreu R$ 18,4 bilhões em resgates em 2022, segundo dados da Quantum. É R$ 1,5 bilhão de saídas por mês. Com isso, o AuM (sigla em inglês para ativos sob gestão) da Verde, que era de R$ 50 bilhões na metade de 2021, atualmente está em R$ 26,9 bilhões, segundo a Quantum.

É verdade que toda a indústria de multimercados sofreu bastante em 2022: foram R$ 87 bi de resgates líquidos ao longo do ano, segundo a Anbima, reflexo da volta da Selic para dois dígitos. Mas o CDI mais gordo não explica toda a história, já que vários fundos multimercados reportaram resgates bem menores ou tiveram até captação líquida positiva em 2022.

Prova disso é que hoje a Verde foi ultrapassada em AuM por outras assets. É o caso da Ibiuna, que em junho de 2021 tinha R$ 21 bilhões sob gestão e atualmente tem R$ 37 bilhões. Outras casas com expertise em multimercados que passaram a Verde em AuM foram Legacy (R$ 29,2 bi), Kapitalo (R$ 28,9 bi) e Absolute (R$ 28,5 bi), gestora fundada pelo Fabiano Rios, que esteve conosco no último episódio do Market Makers e falou um pouco sobre o novo cenário da indústria de multimercados.

Por que a Verde encolheu e outras gestoras não?

Diante do exposto acima, foi muito comum o assunto “o futuro da Verde” entrar nas pautas de conversa que tive com alocadores, gestores de FOFs e analistas de fundos. Quando perguntei a vários deles por que estavam diminuindo participação na Verde, a resposta passava não só pela rentabilidade do fundo, mas também pela ausência de sinais por parte da gestora de que esse cenário vai se reverter nos próximos anos.

“Os outros produtos da Verde não criaram um brilho tão pujante como o fundo Verde, enquanto outras gestoras têm conseguido montar um modelo mais interessante de diversificação de portfólio que tiram o protagonismo da estratégia multimercado. Vemos isso tanto nas gestoras mais novas, como Vista, Capstone e Legacy, quanto as mais antigas, caso de SPX, Absolute e Ibiuna”, disse um dos alocadores com quem conversei.

A pergunta que ninguém fez – e a resposta de Stuhlberger

Com tudo isso em jogo, somente uma pergunta pipoca na minha cabeça: o Stuhlberger, como CEO da Verde, planeja mudar alguma coisa na estrutura da asset diante do resultado de captação e performance dos fundos nos últimos anos?

Parece uma pergunta óbvia, mas ninguém ainda a fez – pelo menos, não publicamente. Elementar: é um assunto delicado de ser abordado, ainda mais com uma das pessoas mais admiradas do nosso mercado. Em janeiro, por exemplo, Stuhlberger concedeu uma entrevista de 1h40min de duração ao Stock Pickers, mas esse assunto sequer foi abordado, infelizmente.

Com a notícia da chegada da Lumina como sócia da Verde, Stuhlberger pode ter dado a resposta (ou começado a responder) o que tanta gente esperava. Como diz a matéria, “as duas gestoras continuarão independentes, mas passarão a atuar de forma complementar. A Lumina deve aportar sua expertise em estratégias de crédito global, crédito estruturado e special situations aos produtos da Verde, que deve criar novas famílias de fundos”.

Esse é justamente um dos principais pontos de críticas à Verde: a dificuldade em criar novas estratégias que não só reduzem a necessidade de performance do principal fundo da casa como também podem municiar as outras com informações mais precisas sobre temas específicos (desculpa mais um jabá ao nosso programa, mas o Fabiano Rios falou muito disso no último ep do MMakers).

Ninguém com quem eu conversava sobre o futuro da Verde esperava algo como isso, por isso a notícia foi uma surpresa muito bem recebida. Muitas assets construíram suas áreas ex-macro do zero; Luis terá a sociedade com um dos nomes mais respeitados do mercado de crédito e special situations, o que lhe garantirá pular algumas casas neste tabuleiro.

Conclusão: me agradará muito se esta notícia for confirmada: como cotista do Fundo Verde e admirador assumido do Stuhlberger, Parreiras, Leichsenring, Harada e toda turma da Verde, estava ansioso por ver alguma reação da Verde diante dos resultados atuais. Meu entusiasmo é ainda maior por ser um movimento que surpreendeu a todos – afinal, Stuhlberger não se tornou quem é fazendo o que todos esperavam.

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Por Thiago Salomão

Fundador do Market Makers, analista de investimentos CNPI-P, MBA em Mercados Financeiros na Fipecafi e na UBS/B3. Antes de fundar o MMakers, foi editor-chefe do InfoMoney, analista de ações na Rico Investimentos, co-fundou o podcast Stock Pickers e foi sócio da XP de 2015 a 2021

thiago.salomao@mmakers.com.br