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Fissuras do Brasil

A maneira como os recursos públicos são aplicados não só revela ineficiências e corrupção, mas também uma gestão pública incapaz de alocar o orçamento de forma eficaz

Por caio.nascimento

10 Jan 2025 10h10 - atualizado em 10 Jan 2025 10h10

Thiago Salomão, Josué Guedes e Walter Maciel (entrevistador convidado e CEO da AZ Quest) intermediaram no Market Makers Podcast uma construtiva conversa sobre o Brasil com quatro grandes economistas e estudiosos da situação do nosso país: Marcos Lisboa (ex-presidente do Insper), Marcos Mendes (pesquisador do Insper), Alexandre Manoel (economista-chefe da AZ Quest) e Samuel Pessôa (pesquisador da FGV).

No papo de quase 2h30, eles expuseram nossas fissuras políticas, econômicas e sociais. 

É um consenso entre os quatro que o Brasil enfrenta um desafio econômico complexo: a maneira como os recursos públicos são aplicados não só revela ineficiências e corrupção, mas também uma gestão pública incapaz de alocar o orçamento de forma eficaz. 

Mesmo com investimentos, o dinheiro não chega aos lugares que mais precisam, deixando um país vulnerável a crises fiscais e exposto à volatilidade econômica.

Assista ao episódio clicando aqui. Abaixo, destaco 5 pontos abordados dentre os tantos temas, mas antes convido você a votar no Market Makers no prêmio MPB (Melhores Podcasts do Brasil).

Isso nos estimulará a produzir ainda mais conteúdos de qualidade.

1) Um país de baixo crescimento estrutural e distorsões microeconômicas

Apesar de algumas boas fases econômicas — em 26 dos últimos 40 anos, o Brasil cresceu quase 3% ao ano, um número considerável — o país continua marcado por distorções microeconômicas e políticas de subsídios que favorecem setores específicos, como o lucro presumido, a Zona Franca de Manaus e diversos programas regionais.

Este emaranhado de subsídios, especialmente no setor elétrico, compromete o crescimento sustentado e cria um ambiente econômico desorganizado. Ao invés de um mercado competitivo, o Brasil perpetua uma teia de incentivos desiguais que reduzem a produtividade e prejudicam o ambiente de negócios. Pior, essas distorções vêm aumentando ao longo das últimas quatro décadas, degradando nosso marco legal e institucional, e afetando a produtividade.

2) A preocupação com uma nova crise fiscal e aumento da dívida pública

O aumento das despesas governamentais e os custos de programas sociais, como o FUNDEB, que hoje está fora da realidade do Tesouro Nacional, somam-se ao problema das emendas parlamentares, ambos pressionando o orçamento. 

Nos próximos quatro anos, a dívida pode crescer em até 14 pontos percentuais do PIB, caso o governo não adote medidas restritivas de controle dos gastos. A PEC da Transição, patrocinada pelo governo eleito de Lula e aprovada quase por unanimidade no Congresso, teve um papel importante nessa trajetória. Embora a atual narrativa fiscal atribua os problemas exclusivamente ao governo anterior, a PEC da Transição ampliou o teto de gastos para atender demandas eleitorais e garantir uma base política. Esse aumento da dívida pública eleva o risco de inflação futura e contribui para a insegurança econômica, impactando investimentos e pressionando as taxas de juros.

3) A narrativa da “herança maldita” e a questão fiscal

Uma narrativa comum no cenário econômico brasileiro é a ideia de “herança maldita”. Segundo esse argumento, o aumento dos gastos atuais é atribuído ao governo anterior, e não ao atual. No entanto, embora Bolsonaro tenha tido um legado negativo ao ceder as emendas parlamentares e o aumento irresponsável do FUNDEB, a PEC da transição trouxe uma expansão expressiva de receita, aprovada quase unanimemente pelo Congresso (incluindo parlamentares bolsonaristas) e capitaneada por Lula. 

O atual presidente está deixando algumas marcas fiscais que ainda afetam o cenário atual: a reindexação dos mínimos em saúde e educação à receita corrente líquida e a vinculação do salário mínimo ao crescimento do PIB.

Ou seja, a complexidade da questão fiscal vai além de simples aumentos de despesas; trata-se de um problema estrutural e contínuo.

4) A pró ciclicidade da política fiscal e a volatilidade econômica

A política fiscal brasileira é notoriamente procíclica, com gastos que aumentam nos períodos de crescimento econômico, o que intensifica as crises. Esta instabilidade afeta o câmbio de forma significativa, refletindo diretamente na alta volatilidade econômica.

Em 40 anos, entre 1980 e 2019, o Brasil teve 26 anos de crescimento considerável. No entanto, nossas crises são mais graves e prolongadas em comparação com outros países emergentes e desenvolvidos. Essa característica gera um país de alta volatilidade, onde o risco é maior e as taxas de juro são elevadas. Além do mais, o setor privado brasileiro, em geral, carece de gestão de risco adequada, sofrendo com essa imprevisibilidade.

5) Impacto da volatilidade no câmbio e no crescimento de longo prazo

A volatilidade do câmbio no Brasil é uma consequência direta dessa política fiscal desordenada. A literatura econômica é clara: a alta volatilidade prejudica o crescimento a longo prazo, pois aumenta a incerteza econômica e dificulta o planejamento e o investimento.

O Brasil é um país com baixa poupança interna e, para manter taxas de juros competitivas, depende de recursos externos. A instabilidade torna o hedge cambial caro, elevando o custo da captação de recursos. Comparativamente, a Austrália, que possui um déficit externo constante de 4% do PIB desde 1985, consegue captar recursos a taxas competitivas devido à baixa volatilidade. Isso ocorre porque sua economia, também baseada em commodities, é estável e previsível.

Assista ao episódio completo clicando aqui.

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