Notícia
3min leitura
Minha grande reflexão no Rio de Janeiro: mercados estão disfuncionais
Antes de qualquer coisa, é preciso sobreviver
“Tripulação, 10 mil pés. Preparar-se para o pouso”
Estivemos segunda-feira passada no Rio de Janeiro. Um dos motivos da viagem creio que todos os quatro leitores desta newsletter sabem: a entrevista com João Landau, fundador e gestor da Vista Capital. O papo, que foi ao ar na última quinta-feira, foi sem dúvida uma das conversas mais francas e interessantes que já fiz nestes 4 anos como podcaster.
Além da gravação, fomos recebidos por algumas das gestoras que raramente aparecem em público ou concedem entrevistas. O legal de conversar com gestores que não querem aparecer de jeito nenhum é que o papo fica muito mais sincero, quase que num estilo “proibidão”.
Nos 40 minutos entre decolar e aterrissar do Santos Dumont a Congonhas, deu tempo de organizar as anotações desta viagem. Queria encontrar o conteúdo que daria uma ótima newsletter (mas que não revelasse os autores) e cheguei nesta reflexão, que resume uma longa conversa em uma das assets de ações mais tradicionais do Rio de Janeiro:
Os preços das ações estão disfuncionais.
Repare, não disse que os preços estão caros ou baratos. Disfuncional, como o próprio nome diz, é algo “cuja função está parcial ou completamente prejudicada”.
E qual é a função do preço? Bom, tendo o preço como a quantia monetária que representa o equilíbrio entre compradores e vendedores de um ativo, ele funciona como um medidor do interesse dos investidores por este ativo. Quando falamos de interesse, leia-se humor do investidor, apetite por comprar (ou vender), entre outros fatores.
É o preço o que vai te fazer concluir se determinado ativo está caro ou barato. Se um ativo está “caro” e os investidores continuam comprando, é sinal que eles seguem otimistas com ele; por outro lado, um ativo “barato” mas com investidores vendendo com força ao invés de comprar denota um pessimismo com este investimento.
Seguindo essa lógica, bastaria comprarmos o que está barato e vendermos o que está caro para termos sucesso na bolsa? Elementar, caro Watson. Agora, em mercados disfuncionais, o preço perde essa capacidade de avaliação: o que está barato pode ficar ainda mais barato, ou então ficar barato por muito mais tempo.
Comprar só porque está barato costuma ser um grande argumento dos “value investors” puristas, que se baseiam muito na proteção da “margem de segurança”. Mas qual tamanho precisa ter a margem de segurança se, no mercado disfuncional, o preço não funciona?
Apesar do tom melancólico, a conclusão a meu ver não foge do óbvio: estando a bolsa barata como está, não tem como não comprar, mas tenha sempre uma parcela em caixa e em ativos seguros como forma de se proteger deste mundo disfuncional. Encare estes ativos como remédios que vão te manter paciente e são nesta travessia – que pode ser beeem longa.
O gestor desta asset carioca fez uma constatação em linha com isso:
“Eu prefiro comprar [ações] do que não comprar, mesmo com o mercado disfuncional. Há boas empresas a um bom preço. Agora, para fugir do que todos estão olhando, focamos nossas análises no que vai acontecer em 24 meses pra frente. É aquela brincadeira com um fundo de verdade: se a bolsa fechar por 5 anos, o que gostaríamos de ter na carteira?”
No entanto, esse mesmo gestor fez um adendo importante: “vale dizer que já achávamos isso do mercado desde o começo do ano passado”.
Isso me lembrou aquela frase de John Maynard Keynes, dita em 1930 quando o mundo afundava numa recessão pós-crise de 1929: “os mercados podem se manter irracionais por mais tempo do que você é capaz de se manter solvente”.
Sim, tem muita ação boa e barata na B3. E sim, a Selic está em vias de começar a cair e isso é bom pra bolsa em vários aspectos (menor custo de capital das empresas, renda fixa menos interessante etc). Mas para aproveitar esse cenário, é preciso se manter solvente. Sobreviver.