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Adriano Pires: 8 lições de um dos maiores especialistas em energia do Brasil
Greta Thunberg mandou Neymar para a Arábia Saudita
O mundo da energia e do petróleo é tão importante para a atividade econômica quanto é complexo. E o que não falta nesse universo são versões, hipóteses e narrativas, às vezes verdadeiras, às vezes não. Para entender de uma vez por todas como funciona o mercado de energia, o preço do petróleo, as dinâmicas da Petrobras e o funcionamento do sistema elétrico brasileiro, trouxemos ao Market Makers desta semana Adriano Pires.
Pires é um dos maiores especialistas em energia do Brasil. Economista com doutorado pela Universidade de Paris, foi professor e pesquisador da Coppe/UFRJ por 26 anos, até fundar, em 2000, o CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura), uma consultoria especializada em energia. Ainda no governo Jair Bolsonaro, foi convidado para presidir a Petrobras, mas não pôde assumir devido à Lei das Estatais.
Das duas horas de conversa que tivemos com ele, estas foram as principais lições:
Por que devemos nos preocupar com a Petrobras
Segundo Pires, alguns dos pilares que garantem a saúde da empresa, estabelecidos durante o governo de Michel Temer, estão ameaçados. O principal deles é a política de paridade de preços do combustível, substituída por uma política ainda vaga e de critérios nebulosos. Outro é a Lei das Estatais, que previa quarentena para executivos das companhias as quais o governo é acionista, mas teve parte de seu teor suspenso pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em liminar. O terceiro pilar é a política de desinvestimento que a empresa conduzia e que pode ser abandonada.
Medidas que ele adotaria se fosse presidente da Petrobras
Se você estava esperando privatização, se enganou, mas pelo simples fato de que isso seria uma tarefa do Congresso Nacional, e não do presidente da companhia. Abaixo algumas medidas que Pires tomaria:
1.“Como presidente da Petrobras focaria mais em algo que ela sabe fazer como ninguém: explorar o petróleo e gás.
2.“Eu venderia refinarias, pois são unidades industriais com passivos ambientais enormes. Havia um um acordo com Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) para vender 50% da capacidade, mas ela continuaria sendo a maior player em refino do país. Eu daria continuação a isso”, diz.
3.Venderia campos onshore (em terra) porque eles são bons para junior oils (empresas menores que trabalham apenas campos já em produção), mas pequenos para as grandes companhias
4.Venderia ativos em águas rasas e focaria em águas profundas. A Petrobras é referência em águas profundas e nunca teve acidente ambiental.
5.Apoiaria a expansão para Margem Equatorial.
Por que a política de preços da Petrobras deve ser a da paridade de importação
Porque o Brasil é um IMPORTADOR de combustíveis e precisa comprá-los pelos preços internacionais. Simples assim.
Greta Thunberg mandou Neymar para a Arábia Saudita
A pressão e a “demonização” dos combustíveis fósseis por parte dos ambientalistas levaram muitas companhias e países a investirem muito menos no petróleo, conforme nós explicamos aqui. Exceção feita ao cartel da Opep+, dominado por Arábia Saudita e Rússia. Menos investimentos resultaram em uma menor produção, mas não em menor demanda. Com isso, o mundo ficou ainda mais dependente destes países. Em tom de brincadeira (é sempre bom deixar claro), Pires afirma que se o futebol saudita hoje é forte a ponto de poder contar com Neymar, isso é graças a ambientalistas como Greta Thunberg, que fortaleceram a posição do país como exportador ao demonizar o petróleo.
A margem equatorial
O Brasil ainda não explora suas reservas na chamada margem equatorial, ao norte de Estados como Amapá e Maranhão. Para Pires, isso é um erro. A reserva brasileira, estimada em entre 14 bilhões e 15 bilhões de barris, beneficiaria com royalties diretamente as unidades mais pobres da federação, como já vem acontecendo com a Guiana, que já explora suas reservas comercialmente e viu seu PIB aumentar em 30%. Segundo o presidente do CBIE, o medo ambiental não se justifica, pois a Petrobras praticamente não tem acidentes ambientais relevantes e é a maior especialista em exploração offshore do mundo.
A grande oportunidade do Brasil
Temos uma oportunidade incrível, segundo Pires, exportando água e sol. O raciocínio é o seguinte: como um dos maiores produtores de alimentos e proteínas do mundo, exportamos água e sol. Podemos fazer o mesmo usando a energia. Com a diversidade energética que nós temos, e o mundo está falando de descarbonização, investimentos em renováveis (como eólicas e solares), a oportunidade está em atrair fábricas para usar energias limpas e exportar seu produto para o resto do mundo. Como no caso do alimento, exportando água e sol. “Imagine fazer um aço no Brasil cuja energia é limpa… o mundo tem que pagar mais por isso se está preocupado de verdade com o aquecimento do planeta. O aço feito com energia limpa aqui tem que valer mais que o aço feito na China”, diz Pires.
Energia solar é o “Robin Hood às avessas” no Brasil
Segundo Pires, quem produz a energia solar, pelas regras atuais, não paga por sua transmissão e distribuição. Mas é claro que alguém está pagando os custos, já que não existe almoço grátis. A distorção, portanto, é perversa, pois quem produz esse tipo de energia hoje são os mais ricos, que podem fazer o investimento necessário. E paga a conta quem não tem dinheiro para instalar painéis solares em casa.
Qual a tendência do preço do petróleo?
Neste segundo semestre estamos vendo preços altos — só não são mais altos porque a China não está crescendo como se esperava. Ano que vem o consumo deve subir e nos próximos anos também, com oferta limitada, na mão de países da Opep, como Arábia Saudita mais a Rússia.